LeugiNase não tem ‘evidência científica’ que comprove eficácia no tratamento contra câncer, diz MPF. Órgão também cobra que Anvisa negue importação do produto.
Ministério Público Federal (MPF) enviou à Justiça Federal em Brasília um pedido liminar (urgente) na segunda-feira (17) para exigir que o Ministério da Saúde deixe comprar e distribuir novos lotes do LeugiNase – medicamento utilizado na rede pública para o tratamento da leucemia linfoide aguda.
Segundo o MPF, não há comprovação científica de que o medicamento seja seguro e eficaz no tratamento da doença.
Para o MPF, o medicamento, que é usado principalmente no tratamento de crianças e adolescentes, apresenta diversas irregularidades. “Não tem comprovação científica de eficácia ou estudos clínicos aprovados por autoridades sanitárias do país de fabricação e não possui farmacopeia reconhecida no Brasil”, diz o órgão.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também é alvo da ação. No pedido de liminar, o MPF exige que a agência negue a importação do LeugiNase ou de qualquer outro produto “sem evidência científica” que tenha na fórmula a substância “L-Asparaginase”.
Para que seja aceito no país, o ministério determina que haja comprovação científica de eficácia, estudos clínicos aprovados por autoridades sanitárias do país de fabricação ou autorização prévia da Anvisa quando feitos no Brasil.
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Relatório do MPF aponta falta de “evidência científica” (parte destacada) para eficácia do LeugiNase
A fórmula chinesa substituiu o Aginasa, produzido por um laboratório japonês e outro alemão. O remédio foi usado de 2013 até 2016, quando foi substituído pelo LeugiNase após uma decisão do Ministério da Saúde que permitiu a importação, em caráter emergencial, no início deste ano. Segundo o MPF, o medicamento que deixou de ser comprado tem índice de eficácia de 90%, comprovado por estudos clínicos.
O Ministério Público Federal também aponta que o índice de “proteínas contaminantes” no remédio chinês chega a 40%, enquanto que no Aginasa o número foi de 0,5%. Há evidência ainda de que medicamento japonês/alemão tem 99,5% do princípio ativo, e o LeugiNase possui apenas 60%.
Recomendação
Em junho deste ano, o Ministério Público Federal recomendou que o Ministério da Saúde deixasse de comprar e recolhesse todos os lotes do medicamento. O MPF sugeria que o órgão voltasse a adquirir o Aginasa.
À época, a pasta afirmou que seguiu “todos os trâmites que permitem uma importação excepcional do medicamento, conforme parecer da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de janeiro de 2017”.
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Frasco do medicamento LeugiNase
Este pedido de liminar foi enviado à Justiça porque o Ministério da Saúde não atendeu à recomendação do Ministério. “O Ministério da Saúde esclarece que a orientação para a compra da L-Asparaginase continua a mesma. Entre produtos com as mesmas qualificações será adquirido o de menor preço, exatamente como foi feito na oferta da Leuginase”, disse a pasta em nota do último dia 10 de julho.
O ministério também disse que o abastecimento do medicamento está regular em 21 estados e no Distrito Federal. O órgão também negou que foram encontrados “contaminantes bacterianos” nas fórmulas adquiridas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
“Até o momento, não se observou efeito além do esperado”, continua nota. “O medicamento Leuginase contém o princípio ativo L -asparaginase com atividade enzimática comprovada por seis diferentes laboratórios”, continua a nota.
Processo de Compra
Na ação enviada à Justiça, o MPF aponta irregularidades no processo de compra do novo medicamento. Segundo o relatório, o Ministério da Saúde não se atentou à possível falta do Aginasa e que, por isso, precisou comprar de forma emergencial o remédio chinês.
O Ministério Público disse ainda que o único critério observado pelo ministério foi o preço (o Aginasa custava US$ 172 e o LeugiNase foi comprado a US$ 38). A ação destaca que todas as sugestões feitas pelo MPF não foram seguidas.
Ainda segundo o MPF, não há registro em banco de dados de estudos clínicos do medicamento em humanos, diferente do medicamento alemão/japonês. “Isso reforça o fato de que o medicamento nunca foi testado em humanos de acordo com as regras estabelecidas pela comunidade científica e por princípios da bioética, requisitos obrigatórios em pesquisas e estudos clínicos”.
Em defesa, o Ministério da Saúde argumentou que o Aginasa também não tinha registro na Anvisa e nem estudos clínicos na literatura científica. Os dois medicamentos estariam em “posição de igualdade”, de acordo com a pasta.
Caso de Ribeirão Preto
O Ministério Público Federal em Ribeirão Preto, em São Paulo, também ingressou com uma ação na Justiça Federal, no início deste mês, exigindo que o Ministério da Saúde recolha todos os lotes do LeugiNase no país. A ação, similar à do MPF-DF, também recomenda que o SUS volte a adquirir o Aginasa, que tem evidência científica comprovada.
A discussão sobre o uso do medicamento teve início em maio deste ano depois que o Insituto Boldrini, em Campinas, em São Paulo, ficou sem o Aginasa e decidiu não usar o LeugiNase, disponibilizado pelo Governo Federal, alegando falta de comprovação de eficácia. O insituto decidiu, então, importar a droga (Aginasa) por conta própria.

Anvisa autoriza Centro Infantil Boldrini a importar remédio alemão contra leucemia