Depois do assassinato de Vanessa Sousa, na noite de domingo (18/5), em Samambaia, outra mulher foi brutalmente morta na manhã de segunda-feira (19/5), em Ceilândia. Liliane de Carvalho tinha 33 anos e deixou três filhos
A barbárie contra as mulheres fez duas vítimas no Distrito Federal em menos de 24 horas. Depois da morte de Vanessa da Conceição Sousa, 32 anos, na noite de domingo (18/5), em Samambaia, Liliane Cristina de Carvalho, 33, foi covardemente assassinada a facadas pelo ex-companheiro Rafael Moreira da Cruz, 34, na manhã de segunda-feira (19/5), em Ceilândia. O autor deu o primeiro golpe na mulher enquanto ela tomava café da manhã. O casal tinha três filhos — de 8, 11 e 13 anos —, que estavam em casa no momento do crime e assistiram à fúria assassina do pai.
A criança de 11 anos levou uma facada na testa e foi hospitalizada, mas não corre risco de morte. Rafael se entregou na 23ª Delegacia de Polícia (Ceilândia). A arma usada, uma faca de aproximadamente 20 centímetros, foi encontrada num bueiro próximo à casa da vítima. Preso em flagrante, até o fechamento desta edição o autor não havia passado por audiência de custódia. Liliane foi a 11ª vítima de feminicídio em 2025 no Distrito Federal. Em 2024, ocorreram 22 casos no total e, em 2023, foram registrados 30 casos.
De acordo com o delegado-chefe da 23ª Delegacia de Polícia, Josué Magalhães, a Polícia Civil (PCDF) tomou conhecimento do crime por meio do próprio autor, que foi até o local e confessou o feminicídio. “Ao ser questionado pelos policiais sobre o que estava fazendo ali, ele disse: ‘Acabei de matar minha esposa’. Os agentes foram à casa da vítima, onde já estavam a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros”, relatou Magalhães. “Ele contou que tinha se separado da mulher havia um mês e soube que ela estava se relacionando com outra pessoa”, completou. Ainda segundo o delegado, o autor tinha passagem pela polícia pelo crime de injúria e ameaça. A ocorrência foi registrada por Liliane em 2013.
Décima vítima
Assassinada a facadas no portão de casa no último domingo, em Samambaia, Vanessa da Conceição Sousa chegou a ser socorrida pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), com apoio do Corpo de Bombeiros (CBMDF), mas não resistiu aos ferimentos e morreu no local. O autor do crime é Silvoneide Carvalho de Torres, 32, companheiro da vítima. Com passagem pela polícia por violência doméstica, o criminoso fugiu, mas foi preso pela Polícia Militar (PMDF).
Para a delegada aposentada da PCDF e doutora em direito Eneida Taquary, o Brasil vive uma epidemia de feminicídios. “Esse é o crime mais grave do Código Penal, com penas de até 40 anos. Mas a legislação não tem barrado essa violência”, observou. “Precisamos de políticas afirmativas que venham do Estado. Não adianta criar políticas penais e processuais penais para segurar a onda de feminicídios”, acrescentou. “Países como o Chile e a Espanha aplicam protocolos de perspectiva de gênero para o acolhimento à mulher e medidas cautelares, como tornozeleira eletrônica em homens que já têm passagem por violência contra a mulher”, finalizou.
Letícia Miranda, advogada atuante em direito cível e penal com perspectiva de gênero, lembra que o contexto no qual as agressões, feminicídios e tentativas de feminicídios ocorrem é o da cultura patriarcal, característica de nossa sociedade. “Existe uma mentalidade predominante, ainda que inconsciente, de menor valorização da mulher e da vida dela, o que resulta na multiplicação e naturalização da violência de gênero. Uma solução definitiva requer uma mudança cultural e de mentalidade”, argumentou. “Essa é uma frente que deve correr em paralelo, pois as violências devem cessar de imediato e proteção é palavra de ordem”, concluiu.
Reforço
De 2020 a 2024, houve um aumento de 743% nos investimentos do Governo do Distrito Federal (GDF) na pauta feminina. O número de equipamentos públicos voltados ao acolhimento e atendimento das mulheres dobrou, passando de 14 para 30 unidades, fortalecendo a rede de enfrentamento à violência de gênero. Foram inaugurados seis Comitês de Proteção à Mulher, que funcionam como espaços de acolhimento e apoio às vítimas de violência e às mulheres em vulnerabilidade social, inclusive, nas sedes das Administrações Regionais e em feiras, promovendo busca ativa e proximidade com a comunidade.
Com investimento de aproximadamente R$ 8,8 milhões, neste mês foram inaugurados quatro Centros de Referência da Mulher Brasileira (CRMB), localizados no Recanto das Emas, São Sebastião, Sol Nascente e Sobradinho II.
Aproximadamente 1.100 pessoas são acompanhadas pelos programas de monitoramento e atendimento prioritário da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), que incluem vítimas e agressores monitorados em tempo real, por meio do Dispositivo de Proteção à Pessoa (DPP) e por meio do programa Viva-Flor, que realiza o monitoramento após o acionamento pela vítima e funciona via aplicativo para acionamento prioritário do Centro de Operações da Polícia Militar (Copom Mulher).
Desde 2018, mais de 3.600 pessoas foram assistidas pela secretaria e, desde 2021, foram efetuadas mais de cem prisões de agressores monitorados pelos programas da SSP/DF por violação das medidas protetivas destinadas a vítimas assistidas pelo DPP e Viva-Flor.
A SSP-DF destaca que os crimes de violência contra a mulher ocorrem, em grande parte, nas casas, em ambientes familiares. Portanto, o principal mecanismo para que os órgãos de segurança pública possam elaborar estratégias de atuação preventiva é a denúncia.
Outras vítimas da babárie
5 de janeiro: Ana Moura Virtuoso, Estrutural;
15 de janeiro: Elaine da Silva, Planaltina;
22 de fevereiro: Géssica Moreira de Sousa, Planaltina;
26 de fevereiro: Ana Rosa Brandão, Cruzeiro;
29 de março: Dayane Barbosa, Fercal;
31 de março: Maria José Ferreira, Recanto das Emas;
4 de abril: Marcela Rocha Alencar, Paranoá;
9 de abril: Danúbia Mangueira de Santana, Park Way;
19 de abril: Valdete Silva Barros, Sol Nascente.