Um estudo publicado na revista Nature Communications revelou que o vírus da herpes simples tipo 1 (HSV-1), responsável pela herpes labial, pode modificar o DNA humano para facilitar sua multiplicação.
Além de invadir as células, ele reorganiza a estrutura tridimensional do DNA do hospedeiro, funcionando como um ‘decorador’ do genoma.
“O HSV-1 é um decorador oportunista, remodelando o genoma humano com bastante precisão e escolhendo com quais partes interagir”, explica Esther González Almela, principal autora da pesquisa.
Pesquisadores do Centro de Regulação Genômica (CRG), em Barcelona, afirmam que essa reorganização do material genético não é um efeito colateral da infecção, mas uma ação planejada pelo vírus, iniciada poucas horas após invadir as células. O objetivo é aproximar genes que ajudam na replicação viral e desligar aqueles que poderiam atrapalhar o processo.
Manipulação inicia logo na primeira hora
Utilizando tecnologias avançadas de imagem e análise do DNA, os cientistas acompanharam como o vírus invade e controla as células humanas.
Já na primeira hora, o HSV-1 sequestra a enzima RNA-polimerase II, essencial para a produção de proteínas, e a leva para áreas dentro da célula onde o vírus replica seu material genético e forma novas partículas.
O que é a herpes labial?
A herpes labial é causada pelo vírus herpes simplex tipo 1 (HSV-1), muito comum.
Os sintomas incluem feridas ou bolhas doloridas nos lábios, ao redor da boca, no nariz ou gengiva.
Após a infecção inicial, o vírus pode permanecer dormente no corpo e voltar a se manifestar quando o sistema imunológico está fraco.
A transmissão ocorre pelo contato direto com a área infectada ou pelo compartilhamento de objetos como copos, talheres e toalhas.
Embora não exista cura, há tratamentos que aliviam a dor e aceleram a cicatrização.
Junto com a RNA-polimerase II, o vírus atrai outras moléculas importantes como a topoisomerase I e a coesina, que ajudam a estruturar o DNA. Isso faz com que os genes humanos deixem de ser ativados e a cromatina, organização do DNA no núcleo celular, encolha até 70% de seu volume.
“Foi uma descoberta inesperada. Pensávamos que a cromatina densa desligava genes, mas aqui é o contrário. Se interrompermos a transcrição primeiro, o DNA se compacta depois. Atividade e estrutura se influenciam mutuamente”, destacou o pesquisador e coautor Álvaro Castells García, da Universidade Médica do Sul, em Guangzhou, China.
As imagens mostram a célula antes da infecção e após uma, três e oito horas, evidenciando como o vírus compacta o DNA do hospedeiro.
Enzima-chave pode ser alvo para bloquear o vírus
Um dos achados importantes foi o papel da enzima topoisomerase I. Ao bloquear sua função em células infectadas, os cientistas conseguiram impedir que o HSV-1 reorganizasse o DNA e começasse a se replicar.
“Em cultura celular, a inibição da enzima parou a infecção antes que o vírus produzisse novas partículas. Isso abre um novo caminho terapêutico para interromper a infecção”, explicou a autora sênior Pia Cosma.
O HSV-1 é um dos vírus mais comuns no mundo. Na maioria dos casos, é assintomático ou causa lesões nos lábios. Porém, pode levar a complicações graves como encefalite, cegueira ou problemas em recém-nascidos e pessoas com o sistema imunológico debilitado.
Apesar das opções para controlar sintomas, não há cura definitiva. Os autores acreditam que descobrir os mecanismos da infecção pode ajudar a criar terapias mais eficazes e impedir que o vírus controle nosso DNA.