É em vista disso que Zelensky e parte da liderança ocidental não veem com bons olhos a perspectiva de que os Estados Unidos, a partir de 2025, possam estar sob uma gestão radicalmente diferente. Afinal, a Europa, como já é sabido, não tem tantos tanques ou granadas para enviar à Ucrânia por tempo indeterminado. Alguns países europeus importantes, como a Alemanha e a França, por exemplo, têm feito inclusive pausas no fornecimento a Kiev, perguntando-se se serão capazes de satisfazer suas próprias necessidades de defesa no futuro, assim como suas próprias obrigações perante a Aliança Atlântica.
Trump, por outro lado, que detém uma profunda desconfiança por alianças que imponham limitações aos Estados Unidos, olha para a OTAN como um instrumento anacrônico, usado pelos europeus para se aproveitar dos favores de segurança fornecidos por Washington. Por vários momentos, antes e durante seu mandato presidencial de 2016 a 2020, Trump indicou que era chegada a hora dos países europeus pensarem na sua própria defesa e de pagarem por isso.
Advém dessa condição o pavor da Europa em ser deixada sozinha novamente, sobretudo pelo fato de o continente não ter aprendido a andar com as próprias pernas a partir da Segunda Guerra Mundial. Todas essas apreensões estão justamente relacionadas com um possível segundo mandato de Trump. Seja como for, até que as eleições ocorram no mês de novembro, o atual presidente americano Joe Biden encontra-se em uma fase conhecida como “lame duck” (ou pato manco, em tradução literal), na qual muito pouco se pode fazer em termos de política externa, por conta de suas ocupações com sua corrida eleitoral desse ano.
Isso faz com que os aliados dos Estados Unidos se vejam em um estado de espera, até mesmo de suspensão. Afinal, quando o presidente Biden ou a sua equipe de segurança nacional pensam em questões estratégicas e de defesa, eles têm em mente que, muito provavelmente, nem a equipe nem o próprio Biden estarão presentes em 2025 para levar a cabo suas ideias.
Trump, em função de seu slogan America First (América primeiro) pretende atender à escola de pensamento mais isolacionista da política externa americana, a mesma que fora exercida pelo país até a primeira metade do século XX. Isso quer dizer que Washington deverá implementar, segundo o republicano, políticas mais independentes, sem assumir muitos compromissos internacionais, seja com a ONU, a OTAN ou o G7. Em especial, dadas as divisões dentro do Congresso americano, é quase impossível que o próprio Biden possa manter em bom termo os compromissos atuais dos Estados Unidos, vide a crise administrativa com o estado do Texas e outras duas dezenas de estados federados em torno da questão migratória na fronteira sul com o México.
Além do mais, Biden também tem enfrentado críticas pelo modo como lidou com a crise no Oriente Médio envolvendo Israel e a Palestina e, não esqueçamos, pela maneira como os americanos deixaram o Afeganistão em 2021. Em suma, Trump logo deverá confirmar-se como o candidato dos republicanos no pleito de novembro ao longo das próximas primárias nos Estados Unidos.
Com as perspectivas dessa nomeação e uma provável vitória no final de ano, uma segunda presidência de Trump deverá abalar certamente alguns dos principais fundamentos da política externa estadunidense. Se a América de fato vier a se isolar a partir de 2025, por sua vez, veremos não somente mudanças geopolíticas na Europa e no próprio Oriente Médio, como também na própria Ordem Internacional, que dará passos ainda mais largos rumo à multipolaridade.
As opiniões expressas neste artigo podem não coincidir com as da redação.