ANA POMPEU e ANGELA BOLDRINI
BRASÍLIA, DF, e SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O Supremo Tribunal Federal (STF) já conta com cinco votos contrários à decisão provisória do ministro Luís Roberto Barroso que autorizou enfermeiros a auxiliar em abortos legais.
Os votos contrários foram dados por Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Kassio Nunes Marques e André Mendonça. A votação acontece virtualmente até a próxima sexta-feira (24).
Na decisão, Barroso também suspendeu processos administrativos e judiciais contra enfermeiros e técnicos que prestarem auxílio no procedimento.
O artigo 128 do Código Penal isenta médicos de punição quando realizam abortos em casos previstos, e Barroso estendeu essa proteção aos profissionais de enfermagem.
Gilmar Mendes argumentou que não há urgência que justifique uma decisão monocrática, pois não há risco imediato que exija a liminar.
Esta foi a última ação do ministro Barroso antes de sua aposentadoria antecipada.
Barroso ressaltou que a escassez de assistência provoca deficiência na proteção de mulheres e meninas vítimas de estupro, permitindo que profissionais de enfermagem ajudem na interrupção da gravidez nos casos permitidos por lei.
Ele também destacou que o governo não deve criar barreiras à realização do aborto legal, nem exigir boletim de ocorrência para atendimento.
Segundo Barroso, o Brasil mantém uma rede pública insuficiente e desigual, ignorando parâmetros científicos internacionais sobre o aborto seguro, que pode ser feito com medicamentos, especialmente no início da gestação.
A falta de políticas públicas eficazes leva meninas e mulheres a manter uma gravidez forçada, causando revitimização e sofrimento, o que configura uma forma de tortura psicológica.
Barroso citou que anualmente ocorrem mais de 16 mil partos de meninas menores de 14 anos no país, totalizando 49.325 entre 2020 e 2022.
Ele denunciou grave omissão do Estado em garantir o acesso ao aborto legal, especialmente para meninas, mulheres e homens transsexuais vítimas de estupro.
O Cadastro Nacional de Atenção à Saúde aponta que apenas 166 hospitais estão habilitados para realizar abortos legais no Brasil, concentrados em 3,6% dos municípios, com mais de 40% dessas unidades no Sudeste.
O Ministério da Saúde informou que entre 2008 e 2015 ocorreram cerca de 200 mil internações anuais relacionadas ao aborto, e foram registrados 770 óbitos maternos por aborto no período de 2006 a 2015, a maioria evitáveis.
Além disso, Barroso votou a favor da descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez, acompanhando a relatora Rosa Weber em uma das suas últimas decisões como ministro.
Na ADPF 442, que pede a descriminalização da interrupção da gravidez, ele deu suporte ao voto da relatora, que é mais detalhado.
A ADPF 1207 solicita que outros profissionais da saúde, como enfermeiros, possam realizar o aborto legal, e a ADPF 989 pede que o Supremo garanta o direito à interrupção da gravidez nas hipóteses previstas pelo Código Penal, além dos casos de fetos anencéfalos.
A ação pediu ainda que o STF declarasse um estado de coisas inconstitucional, o que levaria ao acompanhamento do tema e definição de diretrizes, mas esse pedido não foi aceito pelo ministro.