Pesquisadores relacionaram transtornos como insônia e depressão com a infecção pelo coronavírus
O estudo que até agora acompanhou por mais tempo pacientes que sobreviveram a infecções pelo coronavírus apontou que, nos casos chamados de Covid-19 longa, a prevalência de problemas mentais é um dos conjuntos de sintomas que mais demoram a ceder. Após seguir pacientes por até 16 meses, o trabalho mostrou um aumento de 18% nos casos de depressão e de 13% nos casos de transtornos do sono.
Liderado por pesquisadores da Universidade da Islândia, o estudo abrangeu 247 mil pacientes em seis países europeus. Os pesquisadores notaram que o maior fator de risco para o surgimento de problemas mentais de longo prazo foi o tempo de internação no período da viremia, a fase aguda da infecção.
“Pacientes que ficaram acamados por mais de sete dias tiveram um risco persistentemente maior de sintomas de depressão (61%) e ansiedade (43%) do que aqueles não diagnosticados”, escreveu o grupo, liderado pela psiquiatra Unnur Anna Valdimarsdóttir, em artigo na revista médica Lancet na última semana.
No estudo, os cientistas, que também incluem grupos da Dinamarca, Noruega, Suécia, Reino Unido e Estônia, especulam quais seriam os mecanismos que fazem a infecção pela Covid-19, notável pelos danos ao pulmão e sistema circulatório, ser sentida de forma preocupante também no sistema nervoso.
“A inflamação associada com doenças infecciosas crônicas já se demostrou previamente estar relacionada a morbidades mentais, particularmente a depressão”, afirmam os estudiosos, notando que o impacto psicológico do período de isolamento social também teve um papel. “Ainda precisamos elucidar se a maior prevalência de depressão nesse grupo é mediada pelos processos inflamatórios acima mencionados, pelo isolamento social ou por ambos.”
O estudo saiu na mesma semana em que outro trabalho, da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, mostrou sintomas preocupantes de saúde mental entre os portadores de Covid longa. Nesta outro pesquisa, cientistas submeteram 181 pacientes a testes de memória, linguagem e raciocínio.
“Encontramos um padrão consistente de deficit de memória naqueles que experimentaram infecção por Covid, que aumentava conforme a gravidade dos sintomas relatados”, escreveram os cientistas, liderados pela psicóloga Panyuan Guo, na revista científica Frontiers in Aging Neuroscience.
Ao final, 78% dos pacientes apresentaram dificuldade de concentração, 69% tinham confusão mental, 68% problemas de memória e 60% tinham dificuldade de encontrar palavras para se expressarem. Mais da metade dos voluntários disse ter tido dificuldade em convencer seus médicos de que essas dificuldades cognitivas eram sintomas importantes da doença.
Fatores de risco
Em um segundo estudo do mesmo grupo de pesquisa, publicado na mesma revista, os cientistas exploraram quais sintomas durante a fase aguda da Covid-19 poderiam sinalizar um prognóstico mais preocupante para funções cognitivas. Assim como no trabalho islandês, os pesquisadores constataram que o período de internação (que é proporcional ao tempo de sintomas respiratórios ou inflamatórios graves), foi um importante fator preditivo.
Sinais mais sutis também mostraram alguma correlação. Pacientes que relatavam fraqueza nos braços e nas pernas ou sensação de tontura e dor de cabeça durante a viremia tiveram maior declínio cognitivo.
Em comunicado à imprensa, a psicóloga líder do grupo, Lucy Cheke, manifestou preocupação também com as implicações sociais do estudo. Segundo ela, três quartos dos pacientes avaliados relataram ter ficado incapazes de trabalhar por longos períodos.
— A Covid-19 longa tem recebido pouca atenção por parte de médicos e políticos. Ela precisa urgentemente ser levada mais a sério, e problemas cognitivos são uma parte importante desse problema— afirmou a cientista. — Isso é algo que políticos ignoram quando falam em “conviver com a Covid-19”, ou seja, em não combater a infecção. O impacto na população economicamente ativa pode ser enorme.