Em uma condenação recheada de polêmicas e posterior concessão de clemência por parte do presidente Jair Bolsonaro (PL), o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) abriu mais um flanco na crise com o Supremo Tribunal Federal (STF) na quarta-feira (4).
O parlamentar se recusou a cumprir a determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF, para recolocação de sua tornozeleira eletrônica. Devido a essa desobediência, ele pode ser preso a qualquer momento, segundo um advogado criminalista ouvido pela Sputnik Brasil.
Silveira foi condenado pelo plenário do STF, no julgamento da Ação Penal (AP) 1044, em 20 de abril, a oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicial fechado, por crimes de ameaça ao Estado democrático de direito e coação no curso do processo.
A graça concedida por Bolsonaro, no dia seguinte, sem que tenha ocorrido o trânsito em julgado, é objeto de ações que pedem a nulidade do decreto, prerrogativa do presidente.
Relatora dos pedidos, a ministra Rosa Weber solicitou esclarecimentos ao chefe do Executivo sobre a clemência cedida ao deputado.
Mas, afinal, se a lei é clara e a Justiça é cega, por que a questão tem levantado tanta polêmica nos últimos dias? O imbróglio, que promete mais capítulos até as eleições de 2022, pode ter algum impacto no pleito de outubro?
‘Sentença justa’
Em conversa com a Sputnik Brasil, o advogado criminalista Augusto de Arruda Botelho avaliou que a condenação de Silveira é correta e justa.
O defensor, que considerou ilegal a prisão em flagrante do deputado pela Polícia Federal (PF), em fevereiro do ano passado, leu a sentença e enfatizou que sua análise é técnica e jurídica.
“Não é uma análise política. Importante lembrar que Daniel Silveira foi condenado após uma denúncia oferecida pelo Ministério Público, pela Procuradoria-Geral da República que o denunciou por uma série de crimes — nenhum crime de opinião, ao contrário do que a base do governo sustenta”, apontou.
São crimes graves, em sua avaliação, e o deputado foi absolvido de alguns dos delitos de que foi acusado, lembra Botelho.
“Foi uma análise criteriosa, técnica e, a meu ver, acertada pela condenação. Algumas pessoas contestam a pena que foi aplicada. Mas ela foi aplicada em seu patamar mínimo. Silveira foi condenado três vezes por ter praticado coação no curso do processo e obteve algo próximo à pena mínima. É condizente com a gravidade dos crimes que ele cometeu”, observou.
O fato de ter se recusado a colocar a tornozeleira eletrônica diante de uma oficial de Justiça ontem (4) caracteriza desobediência, sublinha ele.
A depender dos próximos movimentos dos ministros do STF, Silveira inclusive pode ser preso a qualquer momento — simplesmente por não ter acatado uma ordem da Suprema Corte.
“Ele não pode se recusar a receber uma intimação, isso é uma desobediência, como ele também não pode se recusar a atender uma decisão judicial. Se ele não concorda com a decisão judicial, ele tem que recorrer. Ele não pode simplesmente se recusar a cumprir”, declarou Botelho.
Ainda não há data para que os pedidos de cancelamento da graça sejam julgados, mas Alexandre de Moraes determinou que o Banco Central congelasse as contas do deputado federal a fim de garantir o pagamento de uma multa imposta pelo tribunal, fixada no valor de R$ 405 mil.
Aliados bolsonaristas vêm tentando fazer uma vaquinha para o pagamento da penalidade, segundo informou o site Metrópoles.
Então por que a polêmica?
Para o advogado criminalista, a condenação de Silveira levantou tanta polêmica por uma razão bastante simples: muitas decisões de tribunais superiores que envolvem temas judiciais, atualmente, são muito mais decisões que se relacionam à política.
“Esse é um tema que exemplifica isso. É prerrogativa do presidente da República conceder graça ou indulto, é uma previsão legal e jurídica, mas que tem uma conotação, principalmente nesse episódio, estritamente política. Naturalmente isso vai causar um intenso debate”, avaliou.
Ele não acredita, contudo, que essa questão encerre o debate político que envolve o tema. “Até porque já há propostas como a da deputada Carla Zambelli [PL-SP] de conceder a graça a outros apoiadores do presidente e do governo que, de alguma forma, pelos seus crimes praticados, estão sendo processados e condenados”, diz.