Em 2018, a notícia de que um biólogo chinês teria criado os primeiros humanos com DNA modificado em laboratório reacendeu o debate sobre ética da ciência daquele país. Quatro anos depois, ficou mais difícil ultrapassar os mesmo limites de Jiankui
“Sinto a forte responsabilidade de não só chegar primeiro, mas também de estabelecer um exemplo. A sociedade decidirá o que fazer a seguir.” Foi assim que o biólogo chinês He Jiankui apresentou ao mundo, em 2018, seu feito científico controverso: a edição genética de dois bebês humanos para que fossem imunes ao vírus HIV.
De lá pra cá, como previu Jiankui na época, a sociedade chinesa decidiu, ou pelo menos o governo chinês, que experimentos que resultem em humanos aprimorados, ou que possam sofrer por falhas não previstas, não devem mais acontecer.
O mais recente movimento nesse sentido foi um documento distribuído pelo Conselho de Estado da China no qual se pede às instituições de pesquisa que expandam e melhorem o treinamento em ética, aplicando punições para os cientistas.
A intenção é justamente criar uma forma de barrar as lacunas exploradas em experimentos do nível de edição de genes humanos.
O documento atribui a responsabilidade primária pela governança ética às instituições como universidades e laboratórios especializados, mas também pede o estabelecimento de uma associação de ética em ciência e tecnologia para o país.
O texto também afirma que as agências de financiamento e departamentos de pesquisa e desenvolvimento da indústria devem avaliar as violações e punir de acordo com as leis e regulamentos existentes, incluindo a recuperação de fundos, revogação de prêmios e qualificações profissionais e proibição de acesso a fundos públicos por um período de tempo fixo.
Na aplicação de suspensão aos cientistas, a ideia é dar consequências para quem explorar vazios jurídicos. Por exemplo, a pesquisa de Jiankui usando edição de genoma foi supervisionada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, mas então ele implantou embriões editados pelo genoma em mulheres, procedimentos que são supervisionados pelo Ministério da Saúde.
Foram essas lacunas de comunicação e regulamentos que tornaram mais fácil para Jiankui fazer o que fez, já que não estava claro qual autoridade era responsável por monitorar o seu trabalho.
Se tais orientações do governo bastarão para tornar a China mais ética, ainda não se sabe, mas o vale-tudo científico está sim perto do fim.