RENATA GALF
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Após a publicação da decisão que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete envolvidos no núcleo central da tentativa golpista pelo STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quarta-feira (22), o ministro relator Alexandre de Moraes terá pouca liberdade para tomar decisões sozinho sobre os recursos das defesas.
Isso acontece porque, em geral, ele só pode decidir individualmente se entender que os recursos não cumprem os requisitos mínimos para serem aceitos, conforme explicações de especialistas. Além disso, nesse caso, as defesas ainda podem pedir que o colegiado analise a questão.
Com a publicação, começam a contar os prazos para as defesas apresentarem recursos. Segundo as regras do tribunal, embargos de declaração, usados quando a defesa vê algum ponto pouco claro ou contraditório na sentença, podem ser feitos até 5 dias após a publicação deste documento, que formaliza os termos da decisão da Primeira Turma tomada em setembro.
Já os embargos infringentes, que só cabem quando há votos divergentes favoráveis ao réu, têm prazo maior, de 15 dias – prazo que pode se estender, já que embargos de declaração suspendem a contagem do prazo até serem julgados.
Mesmo havendo a possibilidade de decisões individuais, é pouco provável que o ministro tome alguma medida sem antes submetê-la à Primeira Turma, pois as defesas podem usar recursos para levar a decisão para o colegiado.
Se os recursos forem aceitos, a análise do mérito deve ser feita pelo conjunto dos ministros, e não de forma isolada pelo Ministro Moraes.
Por outro lado, como relator, Moraes tem mais liberdade para decidir sozinho sobre questões relacionadas ao cumprimento da pena de Bolsonaro e dos demais réus, como o local da prisão ou a concessão de prisão domiciliar. Mas, mesmo nesse caso, recursos podem levar a discussão para o colegiado.
Atualmente, Bolsonaro está em prisão domiciliar preventiva. Se sua condenação for mantida, o cumprimento da pena só deve ocorrer após o fim dos recursos — algo previsto para 2025.
Em tese, a defesa pode apresentar vários embargos de declaração se ainda entender que existem dúvidas no julgamento anterior.
Não há um limite fixo para a quantidade de embargos, mas se o tribunal perceber que há intenção de atrasar o processo, por repetição de argumentos já usados, pode considerar o recurso protelatório e decretar o trânsito em julgado, encerrando o caso sem analisar o mérito.
Segundo a advogada criminalista Rossana Leques, mestre em direito penal pela USP, qualquer recurso pode ser analisado individualmente pelo relator se for claramente inadequado ou contrário a entendimentos firmados pelo tribunal. Depois, a defesa pode pedir que o colegiado analise.
Davi Tangerino, professor de direito penal da Uerj e advogado criminalista, destaca que mesmo em casos de múltiplos embargos que facilitem uma decisão individual do relator por considerar o recurso protelatório, Moraes provavelmente levaria a decisão à turma. Isso para evitar que a defesa recorra e o caso volte para o colegiado.
O advogado criminalista e doutor em direito processual penal pela USP, Renato Stanziola Vieira, explica que não seria possível que Moraes não submetesse recursos ao colegiado, porque enquanto isso não acontecer, o processo não se encerra.
Enquanto os embargos de declaração são julgados pela própria Primeira Turma, os embargos infringentes, se aceitos, levariam o processo para um novo julgamento no Plenário.
Embora o ministro Fux tenha divergido em favor de Bolsonaro no julgamento, isso não é suficiente para que esse tipo de recurso seja aceito. Segundo precedente recente do STF, seriam necessários ao menos dois votos absolvendo o réu para isso.
O advogado e professor de direito penal da UFMG, Frederico Horta, acredita que, devido a essa jurisprudência, Moraes negará monocraticamente o conhecimento dos embargos infringentes, se forem apresentados. Porém, a turma deve discutir depois o cabimento do recurso.
Ainda sobre como Bolsonaro cumprirá a pena, a decisão caberá a Moraes, relator do caso, após o fim do processo. A defesa deve pedir prisão domiciliar pela saúde debilitada do ex-presidente, semelhante ao que foi concedido por Moraes a Fernando Collor.
Na hipótese de regime fechado, são citados três locais possíveis: a Superintendência da Polícia Federal em Brasília, uma cela especial no Centro Penitenciário da Papuda, na capital, e um quartel do Exército — essa última opção é considerada remota pelo STF.
O advogado e professor de direito processual penal da UFRJ, Antonio Santoro, afirma que, após a decisão definitiva, cabe ao relator determinar o início do cumprimento da pena.
“O relator pode decidir sozinho sobre o cumprimento da pena em prisão domiciliar, sem impedir que a defesa apresente recurso, que deve ser julgado pela turma.”