Quando se pensa em “mineração”, geralmente a imagem que surge é de grandes minas, caminhões carregados e trabalhadores usando equipamentos de proteção, além dos frequentes problemas ambientais relacionados. No entanto, há um tipo de mineração que difere bastante dessa imagem tradicional, e que tem ganhado espaço nas cidades ao redor do mundo.
A mineração urbana se dedica à recuperação dos materiais presentes nos resíduos descartados, promovendo a reutilização dentro do conceito de economia circular. Enquanto a mineração convencional extrai matérias-primas, a mineração urbana tem o objetivo de devolver os recursos já aproveitados para a produção de novos produtos.
Diversos materiais, desde plástico e vidro até metais preciosos como ouro, prata e alumínio, são reciclados e reinseridos na cadeia produtiva. Resíduos de baterias podem ser reaproveitados para a fabricação de novas baterias, e fios e cabos são separados em plástico, que pode ser convertido em energia, e cobre, que é reutilizado na produção de novos cabos. Esse processo é um exemplo prático de economia circular.
“Ademir Brescansin”, gerente executivo da Green Eletron, uma organização sem fins lucrativos, destaca que a mineração urbana é essencial para a transformação dos resíduos eletroeletrônicos, como celulares, notebooks e pilhas, em novas matérias-primas, evitando a extração de recursos naturais que são finitos.
Além de reduzir a necessidade de novas extrações, essa prática contribui para a preservação ambiental, pois impede que os resíduos sejam descartados em lixões ou a céu aberto, protegendo flora, fauna e a saúde das pessoas.
A Green Eletron possui aproximadamente 10 mil pontos de coleta pelo Brasil, atuando há quase uma década com um sistema coletivo de logística reversa que já destinou corretamente mais de 20 mil toneladas de resíduos, promovendo a economia circular e minimizando os impactos ambientais causados pelo descarte inadequado, segundo Brescansin.
O maior desafio é o recolhimento dos materiais, conhecido como logística reversa. Conforme dados do Panorama dos Resíduos Sólidos de 2024, somente 8% dos resíduos sólidos urbanos gerados no Brasil, que ultrapassam 80 milhões de toneladas, são reciclados. Em relação aos resíduos eletrônicos, um relatório da Universidade das Nações Unidas indicou que, em 2019, o Brasil descartou mais de dois milhões de toneladas desses resíduos, mas reciclou menos de 3%.
Desde 2019, o Acordo Setorial de Logística Reversa de Eletroeletrônicos, firmado entre o Governo Federal e associações do setor, determina que as empresas recolham e destinem adequadamente uma porcentagem dos produtos colocados no mercado, tendo como referência o ano-base de 2018. A meta para 2024 é que o recolhimento atinja 17%.
Uma iniciativa destacada dessa política é a inauguração, no final de 2024, da maior unidade de mineração urbana da América Latina. Localizada em São José dos Campos, no interior de São Paulo, a planta, instalada pela Ambipar, recebeu investimento de R$ 100 milhões e pode processar até 80 mil toneladas de resíduos anualmente.
Brescansin ressalta que as expectativas para a mineração urbana no Brasil são muito positivas, com um avanço constante e mais de 7.300 toneladas de aparelhos eletroeletrônicos coletadas em 2024. Entretanto, ainda existem desafios, como a completa adesão das empresas à logística reversa e a mudança cultural necessária para evitar o armazenamento doméstico dos resíduos — atualmente, 85% dos brasileiros ainda guardam esses resíduos em casa.