NICOLA PAMPLONA
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS)
O segmento de combustíveis está preocupado que o aumento da proporção de biodiesel no diesel, logo após o anúncio da redução da fiscalização nos postos, possa resultar em mais fraudes nas vendas de combustível pelos estabelecimentos brasileiros.
A elevação obrigatória da mistura de biodiesel para 15% foi aprovada pelo CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) em reunião realizada quarta-feira (25), com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seguida de cerimônia com líderes do agronegócio.
Na segunda-feira (23), entretanto, a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) anunciou a suspensão do programa de monitoramento da qualidade dos combustíveis e reduziu a fiscalização devido à falta de recursos, após contingenciamento de verbas pelo governo.
“Ampliar o uso de biocombustíveis sem assegurar a qualidade do produto e a fiscalização adequada abre oportunidade para fraudes, prejudicando o meio ambiente e os consumidores”, declarou o presidente do ICL (Instituto Combustível Legal), Emerson Kapaz, em nota.
No início do ano, o mercado havia relatado um aumento nas fraudes envolvendo diesel com teor de biodiesel inferior ao mínimo exigido, fato que levou o governo a adiar o aumento da mistura previsto inicialmente para março.
Na terça-feira, o MME (Ministério de Minas e Energia) defendeu que o uso mais intenso de biodiesel diminui a dependência de importações de diesel e reduz a vulnerabilidade do Brasil às variações dos preços internacionais do produto.
“A adoção do B15 [diesel com 15% de biodiesel] é crucial para garantir resiliência e segurança energética”, afirmou no evento o secretário de Petróleo e Gás do MME, Pietro Mendes, que ressaltou ainda que a medida incentivará a geração de empregos e investimentos.
Entidades e empresas do setor concordam que aumentar o uso de biocombustíveis é importante para a transição energética, mas pedem que a ANP fortaleça a fiscalização contra fraudes.
“O aumento no percentual de biocombustíveis exigirá uma fiscalização mais técnica e rigorosa, com maior monitoramento da qualidade e garantia de segurança ao consumidor final”, afirmou o IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás).
Na segunda-feira, ao anunciar medidas para conter custos, a ANP declarou dispor de um orçamento de R$ 140,6 milhões para gastos discricionários, mas sofreu bloqueio de R$ 7,1 milhões e contingenciamento de R$ 27,7 milhões em maio.
Em 2025, conforme dados da ANP, quase 6% das amostras de diesel avaliadas em seu programa de monitoramento apresentaram irregularidades — percentual superior aos 2% da gasolina e aos 3% do etanol.
A principal irregularidade no diesel, respondendo por mais da metade das amostras não conformes, foi o teor de biodiesel abaixo do percentual obrigatório de 14%.
Um relatório divulgado nesta quarta-feira por analistas do banco Itaú BBA apontou a venda de diesel com quantidades reduzidas de biodiesel como um dos motivos para a perda de mercado das maiores distribuidoras de combustíveis para empresas menores.
As quatro maiores — Vibra, Raízen, Ipiranga e Alesat — perderam 11 pontos percentuais em participação de mercado desde 2022, com maior queda no segmento de diesel e avanço significativo de postos independentes.
Parte dessa perda foi causada pelo aumento das importações por empresas menores, especialmente de diesel russo. Porém, outra hipótese considerada é que o aumento da mistura obrigatória e dos preços durante 2024 possa ter favorecido agentes que não cumprem as regras.
Em entrevista na quarta-feira, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que o governo implementou diversas ações para intensificar a fiscalização e reduzir as fraudes. Contudo, ele não comentou o recente corte orçamentário que levou a ANP a reduzir sua fiscalização.