Neste domingo, eleitores se reuniram em frente a alguns colégios eleitorais em Moscou, a capital russa, em resposta a um chamado da oposição para homenagear o falecido oponente Alexei Navalny e denunciar eleições projetadas para manter Vladimir Putin no poder.
A participação tem sido muito variada dependendo dos locais. Moscou e São Petersburgo foram as cidades onde mais pessoas responderam ao chamado para se concentrar ao meio-dia, estipulado por Yulia Navalnaya, a viúva de Navalny.
Ao meio-dia local, dezenas de pessoas se reuniram em frente ao colégio eleitoral da Escola 2025 de Moscou.
— Não há tanta gente, mas é um bom resultado — declarou Leonid Pakhin, um estudante de 18 anos, e acrescentou: — Não tinha expectativas específicas, estou apenas feliz que as pessoas tenham vindo.
Denis, um jovem de 21 anos que trabalha no setor publicitário, veio expressar seu apoio à oposição sem correr o risco de ser detido. As manifestações clássicas contra o poder são duramente reprimidas na Rússia.
— Vim para expressar minha solidariedade com uma pessoa muito importante (…) estas eleições são uma forma de honrar a memória de Navalny — explicou.
O opositor, principal crítico de Putin por mais de uma década, morreu em 16 de fevereiro, em uma prisão no Ártico, em circunstâncias não esclarecidas.
Advogado de formação, foi preso no início de 2021 e denunciou incansavelmente a repressão e a corrupção das elites russas. Ele também criticou a campanha militar do Kremlin contra a Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022.
Sua viúva, Navalnaya, agora exilada, instou os russos a protestar contra Putin durante o terceiro e último dia das eleições.
Em Marino, outro bairro de Moscou, Natalia, de 65 anos, afirmou que se juntou à concentração para se despedir de Navalny, a quem chamou de “herói”. Sua amiga Elena, engenheira de 38 anos, a acompanhou.
— Esta é nossa única oportunidade de expressar nossa opinião — sustentou.
Presos por homenagem após a morte
A polícia russa prendeu centenas de pessoas durante manifestações em homenagem a Alexei Navalny, no dia seguinte à sua morte, segundo o grupo de defesa dos direitos humanos OVD-Info, a maioria em São Petersburgo e onze na capital, Moscou.
Principal opositor do presidente russo Vladimir Putin, Navalny morreu aos 47 anos na prisão, informaram as agências locais nesta sexta-feira. Em comunicado, o Serviço Penitenciário Federal afirmou que ele “se sentiu mal após uma caminhada, perdendo quase imediatamente a consciência”.
Médicos da instituição teriam sido acionados, e “todas as medidas de reanimação necessárias foram realizadas, mas não tiveram resultados positivos”. O serviço penitenciário informou ainda que as causas da morte “estão sendo apuradas”.
Quando soube que foi sentenciado a dois anos e oito meses de prisão em regime fechado, em 2021, Navalny disse à esposa, Yulia, que “tudo ficaria bem”. Mas ele fez uma aposta alta ao regressar a Moscou após ter sido envenenado, em agosto de 2020, e passado por um tratamento na Alemanha. Sua prisão era esperada, mas a iminência de seu desaparecimento da vida pública jogou o movimento oposicionista russo — e mesmo o governo — em um terreno desconhecido.
Quem era Alexei Navalny?
Ao contrário de outras figuras que dominam a política russa, Navalny não possuía laços com oligarquias ou famílias tradicionais, nem construiu sua base política na época da União Soviética. Nascido nos arredores de Moscou e filho de pequenos empresários, ele passou verões na Ucrânia, origem de parte de sua família e onde aprendeu o idioma local. No fim dos anos 1990, formou-se em Direito na Universidade Russa da Amizade dos Povos, instituição criada nos anos 1960 e que teve entre seus alunos o líder palestino Mahmoud Abbas e o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega. Navalny também estudou finanças.
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Alexei Navalny se tornou conhecido mundialmente ao expor a corrupção nas entranhas de seu país, rotulando a Rússia Unida, legenda de Putin, como “o partido dos vigaristas e ladrões”. Em 2006, começou a escrever um blog sobre corrupção focado nas grandes corporações que comandavam a economia russa.
Em vez de se basear em denúncias anônimas, utilizou estratégia pouco usual: investiu 300 mil rublos (o equivalente na época a R$ 21 mil) em ações de empresas do setor petrolífero. Com isso, conseguia pressionar pela liberação dos números das operações e conquistava acesso a informações que depois usaria em suas postagens críticas.
Um dos casos mais emblemáticos foi a denúncia de desvio de US$ 4 bilhões na operadora de oleodutos Transneft, ocorrido em 2007 e revelado por Navalny em 2010. Apesar de toda documentação, ninguém foi punido e muito menos condenado.
— Esse lado financeiro acabou tendo um impacto mais negativo do que positivo, pois ele foi acusado de querer ganhar dinheiro com essa estratégia.— disse ao GLOBO Angelo Segrillo, professor de história na Universidade de São Paulo (USP).