RICARDO DELLA COLETTA E NATHALIA GARCIA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Um impasse entre os governos da Suíça e do Brasil sobre o setor farmacêutico e discussões sobre regras de origem de mercadorias representam os últimos desafios para a finalização do tratado de livre comércio entre o Mercosul e o Efta (Associação Europeia de Livre Comércio)—grupo composto pela Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein.
Segundo autoridades envolvidas nas negociações, as conversas estão bastante avançadas e quase todos os capítulos do tratado já foram acordados.
As expectativas das equipes negociadoras de ambos os lados são de anunciar o acordo durante a cúpula do Mercosul, que está marcada para ocorrer em Buenos Aires nos dias 2 e 3 de julho, quando o Brasil assumirá a presidência temporária do bloco. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) irá para a Argentina pela primeira vez desde que Javier Milei tomou posse.
Reconhecida como grande produtora de medicamentos, a Suíça solicita que o governo Lula aceite garantias adicionais sobre propriedade intelectual para proteger suas empresas do setor. A justificativa é que um acordo com o Mercosul não pode apresentar brechas que permitam ao Brasil exigir que a produção de determinados fármacos ocorra localmente.
Por outro lado, o governo Lula teme que aceitar esse tipo de compromisso possa criar um precedente que outros países possam explorar em futuras negociações. Na avaliação brasileira, o país já é signatário de um acordo internacional sobre propriedade intelectual, conhecido como TRIPS, tornando desnecessários compromissos adicionais.
Os negociadores esperam superar essa divergência em uma nova rodada de diálogos nas próximas semanas.
Além da propriedade intelectual, outro ponto pendente que impede a finalização das negociações é a discussão sobre as regras de origem das mercadorias. A definição dos critérios que determinam o país de origem de um produto é fundamental para a aplicação de tarifas, impostos e outras regulações comerciais.
O tema se complica devido à forte integração econômica entre os países do Efta e os membros da União Europeia. Por exemplo, em uma análise hipotética sobre a origem de um eletrodoméstico fabricado na Suíça a partir de componentes importados da Alemanha, surgem dúvidas sobre se o produto teria direito à redução tarifária prevista no acordo.
Fontes consultadas pela Folha indicam ainda que as discussões entre Efta e Mercosul também abrangem o comércio e o desenvolvimento sustentável.
Embora tenha recebido menos destaque do que o tratado entre Mercosul e União Europeia, o acordo comercial com o Efta ganhou impulso recentemente, motivado por uma avaliação conjunta da necessidade de diversificar os laços comerciais.
Esse movimento político para avançar nas rodadas de negociação se fortaleceu com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos.
Um acordo inicial entre os países sul-americanos e os membros da Suíça, Noruega, Liechtenstein e Islândia foi firmado em 2019. Naquela época, o Ministério da Economia estimava que o pacto Mercosul-Efta poderia aumentar o PIB brasileiro em US$ 5,2 bilhões ao longo de 15 anos.
A mesma equipe previa uma expansão das exportações brasileiras de US$ 5,9 bilhões e das importações em US$ 6,7 bilhões, totalizando um crescimento de US$ 12,6 bilhões no comércio bilateral.
Inicialmente, as negociações com o Efta enfrentaram os mesmos desafios encontrados nas tratativas com a União Europeia.
Os países do bloco, especialmente a Noruega, viam a política ambiental do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)—marcada por desregulamentação e aumento no desmatamento—como um empecilho para a conclusão do tratado.
Na ocasião, a ex-primeira-ministra da Noruega Erna Solberg chegou a afirmar que o acordo chegava em um “momento desfavorável” devido a uma série de incêndios na Amazônia.
Com a retomada das negociações após a eleição de Lula, o Efta inicialmente ficou condicionado ao andamento das discussões entre Mercosul e União Europeia.
No último ano, o Efta adotou uma nova postura e comunicou ao Mercosul seu interesse em prosseguir com o tratado de maneira separada das conversações com a UE.