Máscara ritual da Zâmbia, pingente da antiga Palmira, pintura do sueco Anders Zorn — esses e outros artefatos furtados ao longo das últimas décadas agora compõem o acervo de um museu virtual lançado pela Unesco na segunda-feira (29/9). A iniciativa visa chamar atenção para o comércio ilegal de bens culturais, uma atividade criminosa pouco conhecida que envolve mais de 57 mil peças, segundo dados da Interpol.
A plataforma interativa museum.unesco.org foi idealizada pelo arquiteto burquinense Francis Kéré, ganhador do Prêmio Pritzker em 2022. Por enquanto, o acervo conta com cerca de 250 objetos, todos digitalizados em 3D e acompanhados de relatos, fotos e informações sobre suas origens — funerárias, decorativas, bélicas ou religiosas.
“É um museu único no mundo”, afirmou a diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay. “Cada peça roubada carrega consigo uma parte da identidade, da memória e do conhecimento das comunidades de onde foi retirada. Esse comércio ilegal prejudica a ciência, rompe vínculos entre gerações e apaga histórias.”
Um museu que deseja desaparecer
A coleção inicial deve aumentar conforme novos objetos forem digitalizados. No entanto, o objetivo final é que a “Galeria de bens culturais roubados” seja esvaziada e substituída pela “Sala de devoluções e restituições”, onde ficarão expostas as peças recuperadas e devolvidas aos seus países ou povos de origem.
“O ideal é que esse museu feche as portas porque todos os objetos tenham sido encontrados e devolvidos”, declarou Sunna Altnoder, chefe da unidade de combate ao tráfico ilícito da Unesco.
Crime invisível, rede global
O tráfico de bens culturais inclui desde saques em áreas de conflito e escavações clandestinas até falsificações e furtos em museus e coleções particulares. Para combatê-lo, a Unesco propõe uma rede de cooperação entre polícias, sistemas judiciais, mercado de arte, governos, sociedade civil e comunidades locais.
“Só uma rede pode vencer outra rede — a criminosa”, resume Altnoder.
A iniciativa também busca devolver visibilidade às obras desaparecidas e restaurar o orgulho das populações afetadas. Ao transformar objetos roubados em testemunhos digitais, o museu virtual da Unesco não apenas denuncia o crime, mas também preserva a memória e reforça o direito à restituição.
