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quinta-feira, 21/11/2024
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TikTok, Shein e Shopee e o impacto do mercado digital no modelo de negócios

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Exemplos recentes mostram como a inovação pode rapidamente mudar o cenário concorrencial em segmentos nos quais há agentes bem estabelecidos

Varejo digital alcança cada vez mais novos “players” (SOPA Images/Getty Images)

Nos últimos anos, a análise concorrencial tem voltado sua atenção aos chamados “mercados digitais”, que consistem em serviços e modelos de negócios inovadores que ganharam destaque à medida que a internet criou formas para que as pessoas se comuniquem e negociem entre si.

E as autoridades concorrenciais ao redor do mundo têm levantado cada vez mais preocupações com o que identificam como sendo “características dos mercados digitais” (em que pesem definições incorretas sobre o que seriam “mercados digitais” em determinados setores), incluindo preocupações relacionadas ao fenômeno do “winner-takes-all”, no qual um player que lança um novo modelo de negócios tenderia a se tornar o destino de preferência dos usuários para aquele tipo de negócio uma vez que tenha sido capaz de atingir escala, e assim supostamente impediria rivais de lançarem empreendimentos semelhantes de sucesso.

Nesse contexto, autoridades concorrenciais questionam-se: seria necessária intervenção governamental para mitigar os efeitos de escala que parecem levar usuários a escolher um determinado serviço em vez de outro? Poderia o cenário resultante da ausência de tal intervenção ser o de consolidação permanente de poder de mercado, impedindo entrantes de ingressar nesses segmentos e contestar os incumbentes, dificultando a inovação e prejudicando os consumidores? Ou existiriam outros fatores capazes de mitigar tais preocupações?

Na análise concorrencial, a observação detalhada de tendências e desenvolvimentos do mercado é central, uma vez que especulações teóricas podem acabar por artificialmente ignorar tendências econômicas relevantes, como no caso do setor de varejo, em que canais offline e online concorrem diretamente.

O TikTok é um exemplo claro e recente de como a inovação pode rapidamente mudar o cenário concorrencial mesmo em segmentos nos quais há agentes considerados “bem estabelecidos”. Ao adotar uma estratégia de conteúdo centrada em vídeo, o TikTok foi capaz de diferenciar seu produto de outros já existentes, o que se mostrou altamente bem-sucedido: de acordo com dados do Statista, o TikTok foi um dos aplicativos líderes em downloads no ano de 2020; em 2021, houve cerca de 1 bilhão de usuários ativos por mês em todo o mundo, um valor impressionante considerando que em 2018 esse mesmo valor era de somente 55 milhões de usuários.

Em comparação, o Instagram possuía 90 milhões de usuários ativos por mês em janeiro de 2013, e somente em junho de 2018 foi capaz de atingir a marca de 1 bilhão de usuários mensais (em 2021, esse número chegou a 2 bilhões). Em termos de receita, o TikTok também registrou forte sucesso, com receitas estimadas em US$ 4,6 bilhões em 2021, um aumento de 142% frente a 2020.

A estratégia de diferenciação de produtos adotada pelo TikTok evidencia os fortes incentivos existentes atualmente, tanto para novos players quanto para aqueles já estabelecidos, à inovação (como o desenvolvimento de novas funcionalidades ou formas de interação). Se um determinado serviço deixa de agregar valor aos usuários, esses últimos podem (e de fato irão) migrar rapidamente para uma das inúmeras alternativas que continuamente surgem, particularmente considerando que existem baixas ou inexistentes barreiras para que eles se registrem em vários serviços ao mesmo tempo.

Um exemplo de como a transição para o mundo digital gera incentivos à inovação é o caso do Magazine Luiza, que expandiu seus canais digitais próprios de vendas para concorrer com serviços de e-commerce no Brasil, registrando um crescimento de mais de dez vezes em apenas quatro anos, e continuando a crescer: no primeiro trimestre de 2021, suas vendas aumentaram 63%, com os canais digitais atingindo sua maior representatividade sobre as vendas totais na história da empresa: 70%.

E, a despeito desse crescimento passado do Magazine Luiza, o setor de varejo no Brasil ainda está dentre aqueles com a maior quantidade de novos players surgindo, tais como Shein, marketplace de itens de moda chinesa que ganhou popularidade entre mulheres jovens, e Shopee, o site multiprodutos de Singapura que estima-se que irá corresponder a cerca de 20% das vendas online no Brasil em 2022.

E, enquanto esses e outros novos players continuam crescer no setor de varejo brasileiro, o Facebook Marketplace — que busca permitir aos usuários da rede social realizar transações uns com os outros — ainda se mantém fora do radar do público em geral, sem quaisquer indícios de que vá conquistar uma posição significativa como canal de varejo no país.

Esse exemplo demonstra como o fato de um player atingir uma certa escala não o torna um incumbente capaz de manter com sucesso sua posição e estendê-la para outros mercados, com pouca ou nenhuma ameaça competitiva. De fato, novos players e novos modelos de negócios são fontes contínuas de rivalidade, e o uso difundido de um serviço em um segmento não implica garantia imediata de sucesso em outro. Novos entrantes geram incentivo para inovação contínua, que não deve ser ignorado na análise concorrencial de serviços digitais — particularmente na consideração de potenciais intervenções governamentais.

O recente lançamento e crescimento de serviços como TikTok, Shein e Shopee são exemplos extremamente atuais de como recursos novos e inovadores são capazes de rapidamente atrair a atenção dos usuários, mesmo em segmentos nos quais já existem players estabelecidos. É importante, portanto, que autoridades de defesa da concorrência considerem como serviços inovadores e a crescente concorrência entre canais online e offline impactam a análise de mercados relevantes na economia brasileira.

*Marcos Exposto é sócio da área de direito concorrencial do BMA Advogados

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