ALEXA SALOMÃO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
A balança comercial entre Brasil e Estados Unidos revela uma grande diferença favorável aos EUA. O mercado americano é o segundo maior comprador do Brasil, representando 12% das exportações brasileiras. Por outro lado, o Brasil ocupa apenas a 18ª posição entre os fornecedores dos EUA, com apenas 1% das importações americanas.
Apesar do Brasil representar apenas 1% das importações dos EUA, esses produtos são importantes para o consumo final e essenciais em várias cadeias produtivas. Uma tarifa de 50% proposta por Donald Trump para todos os produtos brasileiros importados inviabilizaria o fornecimento e causaria prejuízos também aos americanos.
No setor do agronegócio, por exemplo, o suco de laranja do Brasil constitui entre 65% e 70% das importações americanas dessa categoria. O Brasil é ainda o maior fornecedor individual de café para os EUA, com participação que varia entre 20% e 30%, além de representar 12% da oferta de açúcar de cana e 9% da carne bovina no mercado americano.
No setor industrial, o Brasil ocupa posições estratégicas em cadeias de produção importantes. Ele é responsável por 37% das importações americanas de celulose, um insumo básico para a fabricação de papel, embalagens e fraldas descartáveis. Também fornece cerca de 20% do ferro-gusa, ferro e aço para os EUA, materiais utilizados em diversos produtos como latas de bebida, veículos e construção civil. Além disso, o Brasil está entre os cinco maiores fornecedores de aeronaves e peças, principalmente através da Embraer.
“Somos produtores muito relevantes em mercados com poucos fornecedores, o que garante uma vantagem absoluta e pode afetar diretamente o consumo americano”, comenta Verônica Cardoso, diretora de Economia do Direito na consultoria LCA.
Ela explica que não é simples substituir fornecedores, mesmo em setores que parecem fáceis para mudanças, pois envolvem custos com homologação, logística e qualidade. “Trocar fornecedores não acontece de um dia para o outro e pode gerar custos adicionais”, acrescenta Cardoso.
Além disso, mesmo quando há fornecedores alternativos nos EUA, como no caso do petróleo, cuja importação brasileira corresponde a cerca de 5%, substituir o produto nacional envolve adaptações que elevam o preço final. “Se fosse simples, já teriam substituído o petróleo importado pelo produzido internamente”, observa Cardoso.
Apesar de as perdas parecerem maiores para o Brasil, os Estados Unidos também seriam afetados. Felipe Rainato, advogado e consultor em comércio internacional, destaca que os norte-americanos podem até encontrar fornecedores mais baratos, mas ainda assim sentirão impactos. Ele aponta que a política de aumento de tarifas proposta por Trump visa a reindustrialização dos EUA, embora seja controversa e cause efeitos conhecidos, como o aumento do preço dos produtos para o consumidor final.
Especialistas alertam que essa questão deve ser considerada cuidadosamente nos próximos meses.
José Alfredo Graça Lima, diplomata e negociador brasileiro em temas econômicos, reforça que os produtos estratégicos que o Brasil exporta são trunfos importantes nas relações com os EUA, e já foram motivo para que o governo Trump recuasse em algumas medidas, como a retirada da sobretaxa aplicada a eletrônicos para não prejudicar o setor de tecnologia americano.
“Essa tarifa alta causa preocupação e pânico em diversos setores que temem perder um mercado tão importante, pois uma taxa de 50% inviabiliza o comércio”, diz Graça Lima, que também é vice-presidente do Conselho Curador do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais).
Ele ressalta que os importadores americanos ficam insatisfeitos porque serão eles que arcarão com o custo dessas tarifas.
Independentemente do resultado dessas discussões tarifárias, o legado da política de Trump tende a prejudicar as relações econômicas entre Brasil e Estados Unidos.
“Não sabemos exatamente as motivações por trás dessas decisões. Na tarifa de 50%, Trump mistura comércio internacional, ameaças do Brics, defesa das empresas de tecnologia e questões políticas envolvendo o julgamento do ex-presidente Bolsonaro”, observa Marta Castilhos, professora de Comércio Internacional na UFRJ e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Indústria e Competitividade.
Ela acrescenta que, no final, essa política cria incertezas econômicas globais e reduz a confiança dos empresários, dificultando até decisões de investimento.