MATEUS VARGAS
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O Sistema Único de Saúde (SUS) pode ter tido perdas de até R$ 7,29 bilhões entre 2021 e 2023 devido a vacinas, remédios e outros materiais, segundo uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU).
Esse valor inclui cerca de R$ 2,31 bilhões em produtos comprados pelo Ministério da Saúde que venceram enquanto ainda estavam estocados, além de R$ 4,98 bilhões classificados como “perda em potencial”, que são materiais entregues com menos de 90 dias de validade.
As vacinas contra a Covid-19 representam a maior parte dessas perdas, conforme revelou a Folha de S.Paulo. O governo do presidente Lula atribui essas perdas à gestão anterior, de Jair Bolsonaro, afirmando que os vencimentos ocorreram principalmente em aquisições feitas até 2022.
Durante a auditoria, o Ministério da Saúde explicou que as compras feitas no auge da pandemia ocorreram em circunstâncias imprevisíveis e contestou os critérios usados pela CGU para calcular a perda potencial.
Apesar disso, a CGU manteve seus cálculos, apontando evidências de que parte dos produtos entregues com pouca validade de fato foi perdida em algum momento do processo logístico.
A CGU reforça que os valores apresentados são riscos potenciais de perdas, e não perdas confirmadas.
Em resposta, o Ministério da Saúde declarou que implementou uma gestão muito diferente da gestão anterior, destacando ações como a criação de uma Sala de Situação, monitoramento constante, compras com entregas flexíveis e o uso de modelos preditivos para melhor administrar os estoques do SUS.
A auditoria também constatou que atrasos no transporte fizeram insumos chegarem com a validade já vencida. Um exemplo foi a entrega do anestésico propofol para um hospital próximo ao depósito central do ministério, feita 73 dias após o pedido, quando o medicamento já havia vencido há 18 dias.
A CGU recomendou que o ministério defina um limite aceitável para perdas de estoque e atualize o sistema de gestão dos produtos, o Sismat.
Em resposta, o Ministério informou que vai substituir o sistema atual e introduzir ferramentas de inteligência artificial.
Das perdas efetivas encontradas, aproximadamente R$ 2 bilhões eram vacinas contra a Covid-19 e cerca de R$ 213 milhões correspondem a vacinas de outras doenças e medicamentos como insulina.
A auditoria ressalta que oito das dez vacinas mais descartadas fazem parte do Programa Nacional de Imunizações (PNI).
A CGU reconhece que a baixa cobertura vacinal pode contribuir para essas perdas, enquanto o Ministério da Saúde afirma que houve um aumento significativo da vacinação desde 2023.
O relatório também destaca compras quase totalmente descartadas, como cerca de 3 milhões de unidades do fármaco acetato de desmopressina, usado para diabetes insipidus central.
Além disso, cerca de R$ 24 milhões em medicamentos adquiridos por decisões judiciais, destinados a doenças raras ou de alto custo, também foram perdidos. O ministério explicou que cerca de 80% desse valor corresponde a insumos devolvidos por pacientes ou secretarias estaduais e municipais.
Nas perdas potenciais, foram consideradas aproximadamente R$ 4,4 bilhões em produtos com menos de 90 dias de validade ao deixar o estoque e cerca de R$ 530 milhões em insumos vencidos ou não entregues a instituições de pesquisa, o que poderia desviar do uso planejado desses produtos.
O ministério explicou que o envio de lotes para pesquisa não deve ser considerado desperdício, mas a CGU alertou que essas situações podem prejudicar o cálculo correto do consumo e, consequentemente, o planejamento das futuras compras.
Esses dados não incluem casos mais recentes, como a perda de ao menos 80% de um lote de 10 milhões de doses da Coronavac adquiridas no final de 2023, quando a vacina estava em desuso no SUS. O desperdício apenas com essa vacina ultrapassou R$ 260 milhões.
Os dados completos do estoque do ministério ficaram sigilosos desde 2018 por decisão do governo Michel Temer e foram mantidos sob o governo Bolsonaro. Em 2023, quando as informações voltaram a ser divulgadas, a Folha de S.Paulo revelou que cerca de 40 milhões de doses da Covid-19 já tinham sido perdidas em estoque.
