ANA GABRIELA OLIVEIRA LIMA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
A decisão dos Estados Unidos, durante o governo do presidente Donald Trump, de sancionar o ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) criou uma situação inédita e tensiona o Judiciário brasileiro, segundo especialistas consultados pela Folha.
A medida, baseada na Lei Magnitsky, que visa punir pessoas acusadas de violação dos direitos humanos e corrupção, ultrapassa o âmbito do próprio ministro e gera um debate sobre a soberania do país. Esta sanção não deve, segundo especialistas, mudar as decisões do STF relacionadas ao julgamento da tentativa de golpe ocorrida em 2022, associada ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Os Estados Unidos afirmaram que Alexandre de Moraes teria usado sua posição para “autorizar prisões arbitrárias” e restringir a liberdade de expressão. Anteriormente, já haviam proibido a entrada do ministro e de outros integrantes do STF no país, além de aplicar tarifas comerciais elevadas a produtos brasileiros, medidas ligadas ao processo contra Bolsonaro na corte.
Recentemente, a embaixada dos EUA declarou que aliados de Moraes em outras áreas do Judiciário também podem ser alvo de sanções. Em resposta, o Supremo Tribunal Federal publicou uma nota reafirmando seu compromisso com a Constituição e ressaltando que o julgamento dos crimes atribuídos ao ex-presidente é competência exclusiva da Justiça brasileira.
No entanto, o apoio público dos ministros ao magistrado enfraqueceu após a decisão dele de colocar Bolsonaro em prisão domiciliar, devido à desobediência de medidas que restringem o uso das redes sociais para manifestações indiretas. Essa decisão renovou os pedidos de impeachment contra o ministro, especialmente entre bolsonaristas que chegaram a se manifestar no Congresso Nacional.
Alguns ministros do STF demonstraram desaprovação à prisão domiciliar, embora figuras como Gilmar Mendes continuem apoiando Moraes publicamente.
Para o professor de direito da UFSC, Diego Nunes, as sanções internacionais dificilmente afetarão o julgamento de Bolsonaro. Magistrados ouvidos pela Folha concordam que o episódio pode incentivar discursos sobre soberania, mas não deve interferir no processo judicial.
Nunes classificou a ação americana como uma tentativa de desacreditar a Justiça brasileira e disse que a Lei Magnitsky foi mal aplicada, pois destina-se a punir governantes autoritários, criminosos e terroristas, enquanto as decisões do ministro não envolvem graves violações de direitos humanos ou corrupção.
Para a especialista em direito constitucional Adriana Cecilio, a sanção representa um ataque ao Judiciário brasileiro. Ela ressaltou que as decisões de Moraes têm respaldo do STF e que não é papel de outro país interferir nas decisões da corte. Cecilio ressaltou que impeachment de ministros deve ser buscado apenas por vias constitucionais, não por ações externas.
O professor da FGV Direito Rio, Álvaro Palma de Jorge, destacou que o STF precisará refletir sobre a pressão inédita sofrida, pois a sanção ultrapassa a esfera pessoal e atinge o Poder Judiciário como um todo, levantando uma discussão sobre o uso de legislações estrangeiras para penalizar decisões judiciais em outro país.
Além disso, esse tipo de medida pode ser direcionado a outros agentes públicos, como a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República. Álvaro Palma de Jorge perguntou se a lei poderia ser aplicada contra outros membros do governo, como o presidente da Câmara dos Deputados ou da República.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), repudiou sanções estrangeiras contra membros do Poder constituído do Brasil. O presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), reforçou que o Legislativo não aceita interferência nos Poderes e reafirmou a importância de fortalecer as instituições brasileiras para preservar a soberania nacional.
O presidente Lula (PT) considerou inaceitável a intervenção americana e disse que Moraes é alvo de sanções motivadas por políticos brasileiros que traem a pátria para proteger interesses próprios.