As votações tem por fim eleger assembleias regionais e conselhos municipais nas regiões de Luhansk, Donetsk, no leste, além de Zaporíjia e Kherson, no sul — todas elas na frente de batalha
A Comissão Eleitoral da Rússia anunciou nesta quinta-feira, 15, que realizará “eleições” locais no dia 10 de setembro nos territórios ocupados ucranianos um ano antes. De acordo com os russos, as votações tem por fim eleger assembleias regionais e conselhos municipais nas regiões de Luhansk, Donetsk, no leste, além de Zaporíjia e Kherson, no sul — todas elas na frente de batalha.
Há poucos detalhes sobre a realização do pleito, mas a agência estatal de notícias Tass afirmou que a chefe eleitoral russa, Ella Pamfilova, considerou que há condições para realizar os pleitos previstos desde o ano passado. O anúncio vem em um momento no qual os ucranianos fazem uma contraofensiva para retomar tais áreas, mas o nível de sucesso ainda é uma incógnita.
Em setembro do ano passado, o presidente Vladimir Putin anunciou em 20 de setembro do ano passado que faria referendos nas quatro regiões, para que decidissem sobre sua anexação à Federação Russa. Nenhuma delas, nem naquele momento nem hoje, esteve sob comando total do Kremlin.
Classificados como uma “farsa” pela comunidade internacional, o sinal verde venceu com mais de 85% dos votos nas quatro regiões. O modelo foi similar ao adotado na Crimeia, anexada unilateralmente em 2014, em meio ao caos político na Ucrânia. Na época, o governo pró-Moscou de Viktor Yanukovich foi derrubado, e Petro Poroshenko, que defendia maior proximidade com o Ocidente, chegou ao poder.
Contando com a Península da Crimeia, os russos têm hoje o controle de cerca de 17% do país vizinho. Putin afirma que tais regiões são historicamente russas, e demanda que Kiev aceite cedê-las para que haja um cessar-fogo. Os ucranianos, por sua vez, rejeitam negociar a menos que haja uma devolução total das cinco regiões ocupadas.
Referendos de anexação foram realizados no ano passado
Os referendos de anexação do ano passado foram realizados no pior momento da guerra até então para os russos, em resposta à contraofensiva de Kiev. Com o apoio das armas fornecidas pelas potências ocidentais, os ucranianos haviam recuperado milhares de quilômetros quadrados dos russos e causado grandes perdas para Moscou.
Um dia após anunciar as votações, Putin anunciou uma “mobilização parcial” de cerca de 300 mil reservistas para se juntar à guerra na Ucrânia. Mal treinados e com armas insuficientes, os homens sofreram grandes baixas no campo de batalha.
Nos dias iniciais após a mobilização, houve uma reação pública contra a medida, sinal de que o apoio interno à guerra não é tão grande quantos o Kremlin diz ser. Estima-se que ao menos 200 mil cidadãos em idade militar tenham ido para países vizinhos.
Questionado nesta semana sobre a necessidade de novas mobilizações ou de declarar lei marcial, Putin disse que nada disso é necessário neste momento. Admitiu, contudo, alguns problemas em sua invasão.
Segundo o chefe do Kremlin, Moscou poderia ter preparado melhor as regiões no sul do país para assaltos fronteiriços vindos do território ucraniano. Ele referia-se aos ataques em Belgorod, alvo frequente nos últimos dias de drones ucranianos e de incursões de combatentes russos contrários ao Kremlin, que lutam ao lado de Kiev — a autoria foi reivindicada pelos grupos Legião da Liberdade para a Rússia e Corpo de Voluntários Russos.
Em outra ponderação, o chefe do Kremlin afirmou que as tropas russas na Ucrânia não têm munições de alta precisão e drones suficientes. O problema é notório — e motivo de atritos constantes entre o alto comando militar russo e o grupo paramilitar Wagner, que ganhou protagonismo na batalha —, mas a admissão de Putin é simbólica frente às tentativas russas de projetar seu poder.
A confirmação das eleições locais de setembro vem também com a destruição da barragem de Khakovka, em Kherson, no último dia 6. Russos e ucranianos trocam acusações sobre a responsabilidade do incidente, que causou prejuízos para ambos lados, apesar de os danos para o território controlado pela Ucrânia terem sido maiores.
O alagamento impediu que os soldados do país cruzassem o rio Dniéper em sua contraofensiva, mas isso pode em breve ser revertido. O fluxo de água já começou a reduzir e, em breve, o rio deve voltar ao seu curso antigo, mesmo que com novos obstáculos como minas terrestres e destroços.
A usina nuclear de Zaporíjia, maior central atômica da Europa e vizinha da hidrelétrica destruída, recebe nesta quinta a visita de Rafael Mariano Grossi, diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). A viagem tem por fim analisar os danos à planta após o incidente na barragem.
Um dos objetivos será medir e avaliar o nível de água no reservatório usado para resfriar os reatores, que era alimentado pela barragem recém-destruída. As estimativas até o momento de quanta água há no reservatório são incertas, mas Grossi afirmou na terça que “pode haver água para algumas semanas ou talvez um mês ou dois”.