Até os dois anos, Rafael Bittencourt mostrou desenvolvimento típico, caminhando e interagindo normalmente. Contudo, poucos meses após iniciar a escola, a família notou sinais de regressão.
Rafael gradualmente perdeu a fala, tornou-se isolado, apresentou comportamentos repetitivos, desequilíbrio e autoagressão. A mãe, a publicitária Ana Karine Bittencourt, 49 anos, foi orientada pela escola a investigar esses sintomas.
Sem diagnóstico inicial, Rafael já indicava sinais de autismo sindrômico — um transtorno que combina o espectro autista com uma mutação rara no gene DEAF1 —, descoberto somente cinco anos depois.
Buscando o diagnóstico
Aos 2 anos e 4 meses, após avaliação com neuropediatra, Rafael foi diagnosticado com autismo nível 3 e iniciou terapias de fonoaudiologia, psicoterapia e uma dieta restrita sem glúten, leite e açúcar.
Aos 5 anos, após ingerir sopa de peixe, sofreu nova regressão devido à intolerância alimentar. Diante da situação, Ana Karine deixou o trabalho para cuidar inteiramente do filho.
No decorrer dos anos, Rafael enfrentou pequenas regressões e, aos 8 anos, teve convulsões tônico-clônicas, que persistiram apesar do uso de anticonvulsivantes. A família então consultou um geneticista.
Em 2016, o exame genético chamado exoma revelou que Rafael possuía uma mutação no gene DEAF1, associada à síndrome de Vulto-van Silfhout-de Vries — uma enfermidade rara com atraso intelectual, neurocognitivo, autismo e epilepsia. Essa combinação caracteriza o autismo sindrômico.
Ana Karine relembra o impacto emocional do diagnóstico genético que parecia sem solução. A arte da pintura se tornou uma forma de expressão para Rafael, cujos quadros foram exibidos em Brasília.
Autismo sindrômico e seus desafios
O autismo sindrômico está ligado a alterações genéticas, síndromes metabólicas raras, malformações cerebrais e outras doenças neurológicas. Segundo o neurologista Erasmo Casella, do Hospital Albert Einstein, o transtorno pode apresentar características físicas específicas e um risco elevado de deficiência intelectual grave e epilepsia.
Indicativos para esta condição incluem histórico familiar, problemas perinatais e múltiplas malformações corporais. A intervenção precoce com terapias comportamentais é fundamental para melhorar o desenvolvimento, aproveitando a ‘janela de plasticidade cerebral’.
Criação de instituto para estímulo à pesquisa
Diante da escassez de informações sobre a mutação no gene DEAF1, Ana Karine conectou-se com outras famílias pelo Facebook e cofundou o Instituto Mariano de Apoio à Pesquisa em DEAF1 e Autismos Sindrômicos.
O instituto, reconhecido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, financia pesquisas, compra reagentes e mantém pesquisadores dedicados a avançar o conhecimento sobre essa mutação genética.
Ana Karine e os demais membros procuram apoio em universidades e organizações para estimular estudos. Já descobriram que a mutação afeta proteínas ligadas aos sistemas neurológico, digestivo e imunológico.
O objetivo é contribuir para futuras terapias gênicas que possam beneficiar crianças como Rafael.
Hoje, Rafael vive com limitações na fala, restrições alimentares e crises diárias de epilepsia. Medicamentos e terapias, incluindo arteterapia, ajudam no seu desenvolvimento.