A lei, que determina as regras e os incentivos de desenvolvimento urbano, passará por revisão ao longo deste ano para ser enviada pela gestão Bruno Covas para a Câmara de Vereadores até dezembro
A Prefeitura de São Paulo está com uma equipe interna e outra de professores da USP focadas em diagnosticar o que precisa ser calibrado no Plano Diretor para deixar a cidade encaminhada para lidar com o pós-pandemia e outras futuras epidemias. A lei, que determina as regras e os incentivos de desenvolvimento urbano, passará por revisão ao longo deste ano para ser enviada pela gestão Bruno Covas (PSDB) para a Câmara de Vereadores até dezembro.
Ao jornal O Estado de S. Paulo, o secretário de Urbanismo e Licenciamento, Cesar Azevedo, disse que a revisão será pontual, para aperfeiçoar dispositivos que travaram ou não saíram do papel. “Queremos pegar pontos específicos que merecem ser melhorados para torná-los mais efetivos.”
Isso inclui problemas e situações que se tornaram mais evidentes com a pandemia, como o déficit habitacional, a desocupação de parte dos imóveis comerciais (especialmente de áreas centrais), a expansão lenta dos corredores de ônibus, o preparo sanitário necessário para as possíveis próximas epidemias e a sustentabilidade.
O processo de revisão está dividido em cinco eixos: instrumentos de política urbana, meio ambiente, mobilidade urbana, habitação e desenvolvimento econômico e social.
Monitoramento de técnicos do Município publicado em dezembro aponta que é preciso haver “maior enfoque de aspectos de mudanças climáticas, redução de emissão de carbono e protagonismo do desenvolvimento local”, por exemplo.
“Precisamos preparar a cidade para eventuais novas pandemias. Essa discussão não é só em São Paulo, é no mundo inteiro”, diz Azevedo. “A pandemia torna urgente a reflexão sobre os aspectos de planejamento das cidades, além de ações imediatas. Ela impõe desde já aos gestores públicos a responsabilidade de repensar a dimensão urbana da crise. As questões sanitárias ganharam importância como nunca antes vimos nos debates sobre o futuro da cidade”, afirma.
Em cidades como Paris, Barcelona e Buenos Aires, o planejamento urbano é um dos protagonistas das discussões sobre sustentabilidade. Envolve, por exemplo, a promoção da mobilidade ativa (a pé e por bicicleta) e da ideia da “cidade de 15 minutos”, na qual tudo precisa estar a 15 minutos de onde se reside.
Essa ideia de cidade compacta abarca a aposta no adensamento nas áreas com melhor oferta de transporte coletivo, a fim de reduzir os longos deslocamentos pela cidade, diminuir as emissões de poluentes e melhorar a qualidade de vida da população.
Em grandes capitais brasileiras, como São Paulo, especialistas em planejamento urbano e meio ambiente também destacam que a sustentabilidade depende da redução de desigualdades e da garantia de serviços e emprego perto da moradia.
Tudo isso consta no Plano Diretor paulistano. Mas a gestão municipal analisa que, na prática, a lei não conseguiu aumentar a população de certas áreas melhor estruturadas, inclusive em partes do centro, assim como ampliar a oferta de serviços e equipamentos para criar novas centralidades nos bairros.
Embora aborde a necessidade de ajustes no plano, o secretário diz que as soluções e mudanças ainda estão e estarão em discussão ao longo dos próximos meses a partir de um tripé formado por indicadores levantados pela gestão municipal, diagnóstico de especialistas da USP e contribuição da sociedade civil organizada e da população em geral. “Não temos a solução para tudo. Por isso que estamos convidando todos a participarem dessa discussão.”
Críticas
A revisão do plano durante a pandemia foi criticada, gerando uma carta de mais de uma centena de associações pela defesa de um processo “democrático”.
Neste ano, a participação popular será majoritariamente digital, com a possibilidade de eventos presenciais no segundo semestre, a depender das condições sanitárias, de acordo com a gestão Covas.
Eixos estruturados tiveram mais investimento
Um exemplo do impacto do Plano Diretor é que, na capital paulista, mais de 480 novos empreendimentos imobiliários foram entregues nos chamados Eixos de Estruturação da Transformação Urbana entre 2014 e 2019. São áreas com grande oferta de transporte classificadas pelo último Plano Diretor, nas quais há incentivos para a ampliação da oferta de residências.
Segundo monitoramento da Prefeitura, esses locais tiveram um crescimento de 411% em área construída de 2017 a 2019 em relação ao triênio anterior, subindo de 293 mil metros quadrados entregues para 1,2 milhão.
Os exemplos são visíveis com edifícios entregues ou em construção em locais como a Avenida Rebouças e o entorno da estação Vila Madalena, ambos na região centro-oeste, o Tatuapé e a Penha, na zona leste, e a região da Subprefeitura de Pirituba, na zona norte, dentre outros.
Outro resultado do Plano Diretor foi a redução de novos apartamentos com garagem. Enquanto a lei anterior exigia um número mínimo de vagas, a atual desincentiva a criação desse tipo de espaço e até cobra o pagamento de valores extras em determinados locais, como nos Eixos de Estruturação, onde há oferta variada de transporte coletivo.
Entre 2014 e 2018, por exemplo, 14 mil apartamentos foram lançados sem garagem na cidade, número que foi de 194 unidades entre 2009 e 2013.
A queda se repetiu entre as unidades com uma, duas, três e mais vagas, embora o setor tenha registrado um crescimento nos lançamentos imobiliários na comparação dos dois períodos, segundo dados da Embraesp compilados pela Prefeitura.
O Plano Diretor também delimita mudanças e intervenções em pontos específicos da cidade.
Em São Paulo determina, por exemplo, a desativação do tráfego de veículos no Elevado Presidente João Goulart, o Minhocão, e a subsequente demolição ou transformação em parque.