LUANA LISBOA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O medicamento chamado mifepristona, conhecido por ser usado para induzir o aborto, também pode ter um papel importante na prevenção do câncer de mama, segundo artigo recente publicado na revista Lancet Obstetrics, Gynaecology & Women’s Health.
Recomendado pela Organização Mundial da Saúde para interromper gravidez, especialmente quando usado com o misoprostol, a mifepristona tem sido apontada em estudos iniciais como capaz de diminuir o risco desse tipo de câncer, que é a principal causa de morte por câncer entre as mulheres globalmente.
Porém, o uso do medicamento ainda enfrenta resistência das indústrias farmacêuticas devido à sua associação ao aborto. Além disso, em países onde o aborto é restrito, o acesso ao medicamento é difícil, atrasando as pesquisas e o desenvolvimento de novos tratamentos.
Estudos laboratoriais indicam que a mifepristona pode frear o crescimento das células mamárias ao bloquear o hormônio progesterona, que estimula o crescimento celular.
Kristina Gemzell Danielsson, professora do Instituto Karolinska, na Suécia, explica que o efeito do medicamento varia conforme o momento do ciclo menstrual ou gravidez e a dose administrada. No aborto, a mifepristona provoca contrações uterinas para expulsar a gravidez. Durante o ciclo, ela pode impedir a ovulação ou a implantação do embrião no útero.
Para prevenir o câncer, a mifepristona poderia ser especialmente benéfica para mulheres com maior risco, como as que possuem mutações genéticas BRCA, que aumentam a chance de desenvolver a doença.
Atualmente, muitas mulheres com essa mutação optam por cirurgia para reduzir o risco, removendo parte ou toda a mama. Em alguns países, medicamentos que bloqueiam o estrogênio são usados, mas eles não reduzem a mortalidade e têm efeitos colaterais que dificultam o uso contínuo.
Fátima Marinho, especialista em medicina preventiva, ressalta que a falta de interesse das farmacêuticas em investir no medicamento lembra casos anteriores, como o da talidomida, um remédio que inicialmente causou problemas, mas depois foi reaproveitado para tratar outras doenças com sucesso.
Uma das soluções para avançar o uso da mifepristona seria separar as regulamentações para seus usos reprodutivos e não reprodutivos, além de conseguir isenções para pesquisas científicas.
Os pesquisadores destacam a necessidade de mais investimento científico e apoio político para ampliar as opções disponíveis que ajudam a reduzir o risco do câncer de mama.
Além da prevenção do câncer, a mifepristona tem potencial para tratar outras condições médicas, incluindo miomas, atuar como contraceptivo sem estrogênio e tratar doenças como síndrome de Cushing e meningiomas. Contudo, a maioria dos estudos sobre esses usos é antiga, e novos investimentos são essenciais para explorar todo o potencial do medicamento.