FERNANDO CANZIAN
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O Brasil adota há muitos anos barreiras que impedem seu progresso e a melhoria da vida das pessoas, sendo uma das economias mais fechadas do planeta.
Fora das principais redes produtivas globais e com participação menor que 2% no comércio mundial, esse isolamento limita o crescimento, a produtividade e a renda.
Desde os anos 1980, o país vive em uma situação de crescimento lento. Entre 1950 e 1980, o PIB crescia cerca de 7,5% ao ano; desde 1981, essa taxa caiu para aproximadamente 2,5%. O principal motivo é a baixa produtividade.
A produtividade por hora trabalhada cresceu em média apenas 0,5% ao ano entre 1981 e 2023. Enquanto a agricultura avançou cerca de 6% ao ano, a indústria teve queda média de 0,3% ao ano, especialmente no setor de transformação, com queda de 0,9% ao ano.
O setor de serviços, que emprega 70% das horas trabalhadas, praticamente não teve crescimento. Sem um avanço na produtividade, a qualidade de vida da população brasileira não vai melhorar, alertam especialistas.
No setor de máquinas e equipamentos, onde as importações poderiam aumentar a produtividade, o Brasil possui as tarifas mais altas do mundo, chegando até 11,5%.
Fernando Veloso, autor de estudo do Centro de Debates de Políticas Públicas, afirma que isso impede a compra de máquinas modernas e a melhoria da eficiência, dificultando também o aumento das exportações.
O estudo defende que, embora a economia fechada tenha ajudado no passado a industrialização do país, hoje ela dificulta a produtividade e o desenvolvimento.
Isso faz com que o Brasil fique cada vez mais distante dos níveis dos Estados Unidos. Nos anos 1980, um trabalhador brasileiro tinha 46% da produtividade de um americano; hoje, isso caiu para 25,6%, mesmo nível de 70 anos atrás, segundo dados do Conference Board. Ou seja, um brasileiro demora uma hora para fazer o que um americano produz em 15 minutos.
Segundo os autores, o aumento das tarifas nos Estados Unidos durante o governo de Donald Trump evidenciou a necessidade do Brasil diversificar e expandir seu comércio exterior.
Apesar de uma abertura breve nos anos 1990, iniciada no governo de Fernando Collor, com redução das tarifas de 30,5% para 12,8%, o país voltou a apostar na substituição de importações e se afastou da liberalização comercial global.
Veloso afirma que enquanto outros países emergentes reduziram tarifas e entraram nas cadeias produtivas globais, o Brasil permaneceu parado, ficando para trás.
Hoje, as tarifas médias sobre produtos industriais no Brasil são cerca do dobro das mexicanas e quase três vezes maiores que as da União Europeia; o país tem a 13ª tarifa mais alta entre 191 economias, atrás apenas de alguns países africanos e ilhas caribenhas.
Além disso, o Brasil usa muitas barreiras não tarifárias, presentes em 86% do valor das importações, contra uma média de 72% em 75 países analisados. Essas barreiras, como regras técnicas e procedimentos alfandegários complexos, podem aumentar os preços de produtos importados até 2,4 vezes, mais do que as próprias tarifas.
Renato da Fonseca chama o sistema tarifário brasileiro de uma ‘colcha de retalhos’. Sandra Rios, diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento, observa que o problema da competitividade gerado pela proteção elevada foi ‘resolvido’ com vários regimes especiais de importação, chamados ‘puxadinhos’.
Esses regimes incluem medidas setoriais, ex-tarifários (permissão burocrática para importar máquinas sem similar nacional), a Zona Franca de Manaus e o drawback (importar com tarifa reduzida para exportar depois), gerando um sistema fragmentado.
O protecionismo cria barreiras à entrada de tecnologia de ponta e reduz a competitividade. Por exemplo, o custo do iPhone no Brasil é o segundo maior entre 37 países, só ficando atrás da Turquia.
Essa situação afeta muitos produtos, como veículos elétricos e painéis solares, cujas tarifas foram elevadas, contrariando metas de sustentabilidade.
Sandra Rios ressalta que esses regimes especiais beneficiam empresas grandes que conseguem lidar com a burocracia para obter ex-tarifários e medidas antidumping, enquanto pequenas e médias empresas não têm recursos para isso.
Veloso critica políticas como o Inovar-Auto, que, mesmo contestadas na Organização Mundial do Comércio, não aumentaram investimentos em pesquisa e desenvolvimento nem resolveram os problemas de produtividade da indústria automotiva. Também critica os impostos sobre tecnologia estrangeira, que não geraram novos produtos e reduziram empregos.
Apesar da resistência histórica de empresários beneficiados pela proteção, Sandra Rios diz que há crescente insatisfação dentro do setor industrial, citando conflitos no setor de máquinas e equipamentos e a reclamação da Abiplast sobre medidas antidumping para insumos.
Os autores sugerem uma reforma gradual e arrojada para a política comercial, com objetivo principal de reduzir e simplificar tarifas para uma média de 6% em quatro anos, semelhante a países como África do Sul, Colômbia e México.
Outras ações propostas incluem rever o Mercosul, reduzir impostos sobre importações, celebrar acordos internacionais e inserir o país nas cadeias globais de produção.
Mesmo com possível perda de empregos em setores como automotivo, confecção, móveis e calçados, as estimativas indicam que a reforma gerará mais empregos do que destruirá.
Renato da Fonseca conclui que o Brasil tem muitas tarifas para reduzir e que, se quer ser uma economia de mercado, é preciso aceitar que algumas empresas podem falir devido a alocação inadequada de recursos no passado.