Fundação Nacional do Índio será integrada à pasta a ser comandada por Sonia Guajajara, líder indigena que foi oposição de Xavier durante a gestão Bolsonaro
Em ritmo de fim de festa, o Diário Oficial da União publica nesta quinta-feira a exoneração do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Augusto Xavier. No governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva o órgão será integrado ao novo Ministério dos Povos Originários a ser comandado pela líder indígena Sonia Guajajara, perseguida por Xavier assim como outras lideranças durante a gestão de Jair Bolsonaro.
Entre as polêmicas que colecionou no cargo, Xavier não demarcou nenhum centímetro de terra indígena, promessa de campanha de Bolsonaro. Ele ainda pediu a Polícia Federal que abrisse um inquérito para investigar Sonia e outros ativistas da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) por acusações que difamaram o governo federal durante a série na web “Maracá”, em 2020, pela defesa dos povos indígenas e contra violações de direitos cometidas contra esses nativos durante a pandemia da Covid-19.
Há duas semanas, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão na sede da Funai, em Brasília, e na casa do coordenador geral de índios isolados, Geovânio Katukina, em ação contra desmatamento e grilagem de terras na Terra Indígena Ituna-Itatá, localizada no sudeste do Pará. Policiais estiveram no andar onde está localizada a diretoria de proteção territorial do órgão. Foram apreendidos documentos, computadores, celulares e pen drives. O material será analisado pela PF, para reforçar a investigação.
Numa conversa gravada pela Polícia Federal, revelada pelo GLOBO, Xavier parece acobertar um crime cometido por Jussielson Silva, coordenador da Funai na cidade de Ribeirão Cascalheira (MT). Silva foi preso sob a acusação de cobrar propina para alugar pastos na reserva indígena Marãiwatsédé, uma área espalhada por três municípios mato-grossenses onde vivem quase 800 xavantes em mais de dez aldeias indígenas.
Xavier também nomeou no início de sua gestão, em 2019, o pastor Ricardo Lopes Dias para chefiar a coordenação de índios isolados da Fundação Nacional do Índio (Funai), a CGIIRC, no lugar do indigenista Bruno Pereira, assassinado junto ao jornalista inglês Dom Phillips, em junho deste ano, no Vale do Javari. Ele acabou exonerado após denúncias do GLOBO. Nomeado em fevereiro após uma manobra no regimento interno da Funai para ser o responsável pela proteção de povos isolados, Dias Lopes continuou ligado a missões evangelizadoras de indígenas.
A Funai sempre afirmou que seu coordenador havia se desvinculado de projetos missionários há mais de 10 anos, onde atuou pela Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), mas registros levantados pelo GLOBO e depoimentos de índios que trabalharam com o pastor revelaram uma atuação de bastidores do religioso, com foco na formação de futuros ministros que dariam a continuidade ao trabalho por ele iniciado.
Entre as muitas atuações desastrosas e incompatíveis com o cargo que ocupava, Ricardo Lopes Dias foi acusado, recentemente, de tentar quebrar a quarentena da Covid-19 e indicou missionários para área de índios isolados. O caso foi denunciado pela ex-chefe de proteção no Vale do Javari Idnilda Obando, em ofício enviado ao Ministério Público Federal (MPF) e à Diretoria de Proteção Territorial da Funai, revelado pelo GLOBO.
No documento, a servidora cobrou da diretoria da Funai medidas contra o coordenador a quem chama de “ameaça à política pública do não contato aos índios isolados” e o acusa de “proselitismo religioso junto aos indígenas recém-contatados”.