CARLOS VILLELA
PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS)
O morango do amor, muito conhecido, colocou a pequena cidade de Bom Princípio, a 76 km de Porto Alegre, no mapa gastronômico do Rio Grande do Sul.
A cidade, famosa por ser a capital estadual do moranguinho, deve produzir cerca de mil toneladas deste fruto neste ano, segundo a associação Bom Morango, uma quantidade um pouco menor que as 1.100 toneladas colhidas em 2024.
Essa redução mostrou que há um problema com a sucessão no campo, numa cidade de 13 mil habitantes, onde a agricultura familiar é o principal motor econômico. “Muitos agricultores estão reduzindo suas plantações porque não conseguem encontrar quem ajude na colheita”, explica o presidente da Bom Morango, Fabio Flach.
Quase toda a produção de morangos, cerca de 95%, é feita em estufas usando cultivo semi-hidropônico, e a colheita é totalmente manual. Automatizar esse processo não é viável para propriedades pequenas, o que dificulta encontrar trabalhadores para colher a fruta.
“Os jovens de hoje preferem trabalhos em lugares com ar-condicionado, não querem mexer com o trabalho sujo do campo”, afirma Fabio Flach, de 38 anos. Entre as 43 famílias associadas à Bom Morango, muitas são compostas por agricultores aposentados que ainda continuam trabalhando.
A produção e a fama do morango do amor estão nas mãos de cerca de 60 famílias na cidade, que se surpreenderam com a popularidade fora da época usual da safra, que normalmente alcança o pico em setembro.
“No começo, não acreditava que o morango do amor faria sucesso. Mas na semana do lançamento, acabou rapidamente: padarias, confeitarias e mercados compraram tudo, o que fez o preço subir”, conta Flach.
O preço de quatro bandejas, com cerca de um quilo, subiu de R$ 25 no início do inverno para mais de R$ 60. Fabio Flach comenta que eles tiveram que reduzir a quantidade entregue para alguns compradores para evitar conflitos, mas espera que na safra os preços voltem ao normal.
Fabio Flach garante que os agricultores não estão aproveitando a popularidade do morango para cobrar preços abusivos. “Ninguém está produzindo em grande quantidade; todos estão produzindo pouco, e esse pouco já é importante para nós”.
Ele alerta que o morango de Bom Princípio pode desaparecer dos mercados se não houver ações para atrair os jovens ao trabalho no campo. “Em alguns anos, iremos perceber por que estamos discutindo agora sobre sucessão rural, e aí pode ser tarde demais.”
Flach acredita que é essencial aprender a conciliar tradições com o avanço tecnológico, para que os filhos e netos possam continuar na agricultura. “Muitos pais são resistentes a mudanças, mas aceitar investimentos como irrigação pode facilitar o trabalho e atrair os jovens”.
Os agricultores ainda estão se recuperando dos danos causados pela enchente histórica de 2024, que afetou ao menos 25 propriedades e destruiu muitas estufas. Fabio Flach vê como positivo o aumento do preço do morango, pois iniciar uma nova plantação é difícil, especialmente após perdas tão grandes.
Apesar da queda na safra de 2025, a cidade espera atrair 180 mil visitantes para a Festa Nacional do Moranguinho em setembro, um dos maiores eventos culturais da região, que acontece a cada dois anos.
O morango do amor é a principal atração desta edição da festa, segundo Gerhard Ledur, presidente da comissão organizadora. O evento contará com shows, expositores de comércio e gastronomia relacionados ao morango, oferecendo produtos como tortas, cucas, fondue e até chope feito com a fruta.
Gerhard Ledur acredita que a popularidade do morango do amor vai diminuir até setembro, mas a curiosidade deve manter o público interessado. Para atender a demanda, foram convidadas confeiteiras locais que não têm ligação com a festa para preparar morangos do amor em suas casas.
A cidade será decorada com motivos de morango em praças, postes e prédios. A entrada da festa terá um grande pórtico em forma da fruta, chamado Morangão.
Gerhard Ledur ressalta que a festa, a primeira após as enchentes de 2024, pode ajudar a reconectar os moradores à importância da produção de morango para a cultura local.
“O morango do amor tem trazido uma divulgação espontânea e gratuita para nossa cidade”, conclui Ledur. “Os agricultores estão felizes com a atenção, e a festa será um impulso para recuperação dos prejuízos”.