Gabriel Gama e Giuliana Miranda
São Paulo, SP, e Bonn, Alemanha (Folhapress) – Pela primeira vez, a população afrodescendente foi mencionada em um documento preliminar na convenção do clima da ONU. As reuniões climáticas que ocorreram em junho em Bonn, Alemanha, consideradas um indicador para a COP30 em Belém, reconheceram esse grupo em dois dos três textos apresentados.
Os países aceitaram incluir pessoas de ascendência africana no texto sobre uma transição justa. Além dos afrodescendentes, o documento ressalta a importância de incluir outros grupos vulneráveis como migrantes, povos indígenas e trabalhadores informais, para garantir caminhos eficazes, inclusivos e participativos durante a transição.
O plano de trabalho sobre gênero, que visa integrar a temática em todos os documentos finais, faz referência à população negra em quatro ocasiões. A versão definitiva dos textos será definida na cúpula na Amazônia, em novembro, mas a sociedade civil comemora os avanços até o momento.
“No sistema da convenção do clima da ONU, nunca houve um documento que mencionasse afrodescendentes”, destaca Mariana Belmont, assessora de clima e racismo ambiental do Geledés – Instituto da Mulher Negra, que realizou o levantamento das menções.
Ela comenta que este é um espaço da ONU com foco técnico, que avançou lentamente em direitos humanos nos últimos anos. A população afrodescendente é um dos grupos mais afetados pelos eventos climáticos extremos, mesmo tendo contribuído pouco para as mudanças climáticas.
A diplomata brasileira Liliam Chagas, participante das negociações em Bonn, ressaltou a novidade da referência. “Diversas instituições brasileiras, incluindo o Ministério da Igualdade Racial, demandaram claramente o reconhecimento das vulnerabilidades dessas populações, e isso foi conquistado pela primeira vez”, afirmou após a conferência.
Apesar da expectativa de incluir indicadores raciais no texto sobre adaptação, não houve consenso entre os países. Segundo Belmont, o Brasil foi o mais atuante para incluir a menção a afrodescendentes, com apoio de países da América Latina e Caribe, como Colômbia, Uruguai e Panamá.
A COP16 da biodiversidade, realizada em 2024 em Cáli, Colômbia, também foi pioneira ao mencionar esse grupo no documento final.
Para Belmont, os países europeus são os principais obstáculos à inclusão de afrodescendentes nos textos, citando que a União Europeia age nos bastidores para impedir essa pauta, apesar de não se posicionar publicamente contra. Ela relata que houve tentativa de barrar a menção no texto sobre gênero, mas a pressão da sociedade civil possibilitou sua aprovação.
O estudo sobre a exclusão climática em populações vulneráveis é realizado em parceria com a Fundação Ford.