YURI EIRAS
FOLHAPRESS
Um estudo feito pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), divulgado na última quinta-feira (4), revela que a maior parte das Polícias Civis do Brasil já utilizam programas de reconhecimento facial para ajudar em investigações criminais.
Dos 26 estados brasileiros, mais o Distrito Federal, em 14 a Polícia Civil já usa esse tipo de software. Em 13 estados, as secretarias de Segurança também adotam programas de reconhecimento facial, e em três estados, o Ministério Público estadual utiliza essa tecnologia.
A pesquisa indica ainda que secretarias de sete estados utilizam câmeras corporais nos uniformes dos policiais. Outros três estados estão em processo de compra dos equipamentos e um está em fase de instalação.
O levantamento foi realizado com base em respostas obtidas pela Lei de Acesso à Informação (LAI) e pesquisa em portais de transparência.
O estudo também encontrou dificuldades para obter informações. Entre as secretarias de Segurança, quatro negaram utilizar reconhecimento facial e 12 não responderam; entre as Polícias Civis, apenas três detalharam custos ou contratos; nas Promotorias, 15 negaram uso e dez não informaram.
O reconhecimento facial, regulamentado pelo Código de Processo Penal, é uma prática tradicional nas polícias, que agora, com o avanço das redes sociais, complementa ou substitui o álbum de fotos manual mediante o uso de softwares automáticos.
O estudo questiona essa prática, apontando que há fragilidades nas provas e que pesquisas mostram que o reconhecimento facial pode levar a prisões e condenações injustas.
Segundo o levantamento, os estados onde as Polícias Civis utilizam programas de reconhecimento facial são: Paraná, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Roraima, Maranhão, Ceará, Bahia, Sergipe, Rio Grande do Norte e Paraíba.
Estados onde a Polícia Civil não utiliza a tecnologia, mas as secretarias de Segurança sim, são: Rondônia, Acre, Pernambuco e Alagoas. No Amapá, o Ministério Público estadual usa algum software e os demais órgãos não responderam. São Paulo não forneceu resposta.
Pablo Nunes, diretor do Cesec, afirma que o programa mais utilizado pelos estados é o americano Clearview AI, que possui um banco de dados com mais de 60 bilhões de imagens e promete 99% de precisão nos dados demográficos. A ferramenta também possui sistemas que facilitam o trabalho investigativo.
De acordo com o Cesec, o Clearview coleta fotos de redes sociais e sites públicos sem consentimento das pessoas. O programa já foi banido ou teve sua utilização restrita em países da Europa, no Canadá e na Austrália.
Pablo Nunes destaca que “O sistema vende um grande banco de imagens, que é constantemente atualizado por robôs que recolhem fotos da internet, publicadas em perfis públicos em redes sociais e no Google. Do ponto de vista legal, há um grande problema na operação desse sistema, pois não há pedido de consentimento das pessoas cujas imagens são processadas.”
Ele acrescenta que ainda não existe legislação específica para o uso responsável dos programas de reconhecimento facial. Na Câmara, tramita um projeto de lei que estabelece normas para sistemas de inteligência artificial, com origem no Senado, que já conta com comissão especial para discussão do tema.
Sobre o uso das câmeras corporais, os estados que confirmaram utilização são: Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia, Paraíba e Pará. Alagoas, Acre e Piauí estão em processo de licitação e o Amazonas em fase de instalação. Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Sergipe e Ceará declararam não usar as câmeras.
Os estados Goiás, Espírito Santo, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rondônia e Amapá não informaram sobre o uso. Roraima e Maranhão tiveram uso classificado como inconclusivo.
Pablo Nunes comenta que “Não recebemos justificativas oficiais para a não utilização das câmeras. Muitos governadores acreditam que segurança pública é deixar os policiais agirem sem restrições.”
Ele ainda ressalta: “Houve resistência em enviar respostas, o que é revelador. As câmeras podem ser usadas para reduzir a letalidade policial, se forem aplicadas em políticas integradas de controle, mas também podem ser mal utilizadas. O mais importante não é apenas possuir as câmeras, mas garantir que elas sejam efetivamente usadas para diminuir mortes.”

