O zoológico Parque Arruda Câmara, conhecido como Bica, localizado em João Pessoa (PB), voltou a abrir suas portas nesta quinta-feira (18/12) após um período fechado que começou em 30 de novembro. A suspensão ocorreu depois que Gerson de Melo Machado, de 19 anos, apelidado de “Vaqueirinho”, entrou no recinto dos leões e foi fatalmente atacado por uma leoa.
Durante o fechamento, o parque realizou uma revisão completa nas suas instalações e protocolos de segurança. Com a reabertura, foram estabelecidas novas regras, e passou a ser utilizado um sistema de vigilância com câmeras equipadas com Inteligência Artificial (IA).
Segundo comunicado do parque, as melhorias incluíram a inspeção de grades, barreiras, vigilância, fluxos internos, rotinas de manejo e normas operacionais, acompanhadas de relatórios técnicos e listas de verificação.
O horário de funcionamento do zoológico foi alterado; agora funciona de quarta-feira a domingo, das 9h às 16h. É proibido que os visitantes alimentem os animais e devem manter uma distância mínima dos recintos.
Após o incidente, a leoa Leona se tornou a atração principal do parque. Por isso, foram implementadas regras específicas para assegurar o bem-estar da felina. O espaço dos leões recebeu melhorias ambientais e Leona será monitorada constantemente por veterinários, que têm autoridade para suspender a visitação caso os critérios de saúde e segurança não sejam respeitados.
Protocolo de atendimento a vulnerabilidades
A equipe do zoológico foi treinada para identificar e acolher adequadamente pessoas com vulnerabilidades psicológicas, com o intuito de evitar tragédias semelhantes à que vitimou Gerson.
Conforme as autoridades, Gerson, que enfrentava problemas mentais, escalou uma parede com mais de seis metros e superou as grades de proteção, utilizando uma árvore para entrar no recinto da leoa. O episódio foi registrado em vídeo por visitantes presentes no parque.
Gerson tinha um apreço especial por felinos e frequentemente manifestava o desejo de viajar à África para cuidar de leões. Sua mãe convivia com esquizofrenia, assim como seus avós, o que resultou no abandono familiar e na colocação de Gerson e seus irmãos para adoção. Apenas ele não conseguiu ser adotado.
O Instituto Médico Legal (IML) constatou que a morte foi causada por choque hemorrágico devido à perfuração dos vasos cervicais; a leoa mordeu o pescoço de Gerson, atingindo artérias e veias, mas não consumiu o corpo.
Monitoramento com inteligência artificial
O secretário municipal do Meio Ambiente de João Pessoa, Welison Silveira, informou que o efetivo da Guarda Municipal foi ampliado no parque, que também implantou câmeras integradas ao programa Smart City.
As câmeras inteligentes monitoram comportamentos suspeitos e identificam faces de pessoas com mandados de prisão, ajudando a prevenir incidentes e furtos por meio da inteligência artificial.
A Polícia Civil da Paraíba afirmou, em 4 de dezembro, que não foram encontradas falhas de segurança no recinto onde ocorreu o acidente, considerando o fato como uma ocorrência atípica e confirmando que o parque segue as normas técnicas.
Abandono e proteção social
A tragédia expôs a trajetória de Gerson, marcada por pobreza extrema, transtornos mentais sem tratamento e falta de apoio familiar. A conselheira tutelar Verônica Oliveira, que o acompanhou por oito anos, ressaltou que ele cresceu sem suporte adequando e em condições muito difíceis.
Gerson foi encontrado pela primeira vez com 10 anos, quando a Polícia Rodoviária Federal o levou ao Conselho Tutelar por tê-lo visto caminhando sozinho em uma rodovia. Desde então, ele passou a fazer parte da rede de proteção da infância.
A mãe de Gerson, que perdeu o poder familiar, continuava sendo procurada por ele, apesar de sua situação mental e incapacidade de cuidar dos filhos, segundo Verônica.
Entre os irmãos, apenas Gerson não foi adotado, possivelmente devido ao seu transtorno mental, pois a sociedade tende a preferir crianças sem problemas, o que dificulta a adoção de crianças em situação de acolhimento institucional.
O sonho de cuidar de leões
Desde pequeno, Gerson manifestava o sonho de viajar para a África e cuidar dos leões. Esse desejo foi repetido em várias ocasiões para a equipe do Conselho Tutelar.
Em uma situação grave, tentou entrar clandestinamente em um avião para realizar esse sonho, conforme relatado por Verônica nas redes sociais.
“Você falava que iria pegar um avião para um safári na África, para cuidar dos leões. Tentou realizar isso, mas graças às câmeras foi impedido antes que algo pior acontecesse.”
Policiais que lidaram diretamente com Gerson confirmam que ele repetia insistentemente o desejo de ir à África e cuidar dos leões. Com 16 registros por pequenos delitos, ele dizia que faria a viagem caminhando, mesmo com a barreira oceânica entre os continentes, e os agentes tentavam explicar essa distância para ele.

