Padre Júlio Lancelotti recebeu uma ordem para não transmitir missas pela internet e parou suas postagens nas redes sociais após determinação de Dom Odilo Scherer, cardeal e arcebispo de São Paulo. Se Padre Júlio discordar dessa decisão, ele pode recorrer ao papa?
O Código de Direito Canônico estabelece maneiras de contestar decisões, começando pelo contato direto com quem tomou a decisão. Um documento de 1983, assinado pelo papa João Paulo 2º, indica que “quando um sacerdote se sentir prejudicado, deve tentar resolver a questão diretamente com o superior que fez a ordem”.
Um sacerdote pode usar um recurso hierárquico para contestar a decisão, levando o caso a uma autoridade superior. No caso do Padre Júlio, que é diocesano, a ordem veio de Dom Odilo, que tem posição de arcebispo e cardeal. Acima dele, na hierarquia da Igreja, só está o papa.
Um dos primeiros passos é o Tribunal Eclesiástico Canônico local, que trata de questões disciplinares e da vida da Igreja. Esse tribunal não pode cancelar a decisão de um bispo ou cardeal, mas pode emitir opiniões que ajudam instâncias superiores.
Se o problema não for resolvido localmente, a Igreja oferece a possibilidade de contestação em nível central, no Dicastério para o Clero, que pode pedir a revisão da decisão se suspeitar de abuso de autoridade ou violação do Direito Canônico. Caso a sugestão do Dicastério não seja aceita, o papa pode intervir e mandar que a decisão do Dicastério seja seguida.
Assim, o recurso chega até o papa, seja pelo órgão responsável, seja por iniciativa direta dele, especialmente em casos de grande importância ou repercussão. Por exemplo, em 2023, o papa Francisco retirou das funções um bispo dos Estados Unidos por críticas feitas ao acolhimento católico à comunidade LGBTQIA+. Em outro caso, em 2019, o papa destituiu um cardeal acusado de abuso.
Padre Júlio reforça que mantém “afiliação e obediência à Arquidiocese de São Paulo”. A Arquidiocese afirma que o assunto é interno da Igreja e vem sendo tratado entre o arcebispo e o sacerdote. Toninho Kalunga, ex-vereador do PT e amigo pessoal do Padre Júlio, disse em entrevista que a decisão de Dom Odilo é para proteger o padre de perseguições políticas e que isso não limita suas ações nas ruas, junto aos pobres.
Padre Júlio Lancelotti foi ordenado em 1985. Ele coordena a pastoral do Povo da Rua da Arquidiocese de São Paulo e é pároco da Igreja São Miguel Arcanjo, na Mooca, zona leste de São Paulo. Ele sofre críticas de grupos conservadores, que alegam que ele atua mais como político do que como religioso.

