O jejum prolongado é a prática de ficar muitas horas ou dias sem se alimentar, atraindo pessoas que buscam desde perda de peso até possíveis benefícios para a saúde. Esse período sem ingestão alimentar causa transformações profundas no corpo, que vão muito além de simplesmente “ficar sem energia”.
Logo após a última refeição, o corpo está em um estado alimentado, absorvendo nutrientes, com níveis elevados de glicose e insulina. O excesso de açúcar é armazenado como glicogênio no fígado e nos músculos.
“Após três ou quatro horas, iniciamos uma fase de jejum, na qual a insulina diminui e o glucagon aumenta, promovendo a quebra do glicogênio para manter a glicose sanguínea”, explica a endocrinologista Carolina Janovsky. Essa reserva de glicogênio dura aproximadamente 24 horas.
O nutrólogo Felipe César detalha que, inicialmente, o corpo utiliza a glicose do sangue, depois recorre ao glicogênio, que funciona como uma reserva de energia para o cérebro. “Dependendo do tamanho dessas reservas e do nível de atividade física, esse estoque dura em média entre 12 e 24 horas. Após esse período, o corpo é sinalizado a buscar outras fontes de energia”, esclarece.
Adaptação metabólica e uso da gordura como combustível
Quando o glicogênio se esgota, ocorre uma mudança metabólica significativa. “O corpo começa a usar a gordura armazenada como principal fonte de energia. O fígado transforma essa gordura em corpos cetônicos, que podem ser usados por quase todos os tecidos, inclusive pelo cérebro. Esse processo é chamado de cetose”, destaca Felipe.
Durante o jejum prolongado, outras adaptações acontecem. Há uma diminuição da insulina, aumento do glucagon — hormônio que auxilia a liberar glicose do fígado para o sangue — e maior quebra das reservas de gordura para gerar energia.
O corpo também passa a produzir glicose a partir de proteínas e gorduras, em um processo denominado gliconeogênese, para manter as funções vitais. Além disso, ativa-se a autofagia, um mecanismo que limpa e recicla componentes celulares danificados, promovendo saúde e longevidade. “É como se o corpo entrasse em modo de economia e reparo”, afirma o nutrólogo.
Sinais de alerta
Segundo Carolina, a prática do jejum sem acompanhamento pode causar desidratação, desequilíbrio eletrolítico, arritmias, problemas renais, hipoglicemia, perda de massa muscular, deficiências nutricionais e até síndrome da realimentação — uma condição grave causada pela retomada inadequada da alimentação.
Em situações extremas, como na fome prolongada, o organismo pode consumir proteínas dos órgãos vitais, levando a falência desses órgãos.
Felipe reforça a importância de respeitar os sinais do corpo. “Cansaço extremo, tontura intensa, fraqueza muscular severa, dores de cabeça fortes, náuseas, palpitações e confusão mental indicam que o jejum pode estar ultrapassando limites seguros”, alerta.
Benefícios do jejum prolongado
Quanto aos benefícios, especialistas concordam que protocolos mais curtos, como o jejum intermitente, possuem evidências sólidas associadas à melhora da sensibilidade à insulina, redução da gordura corporal, diminuição da pressão arterial e melhora do perfil lipídico.
Protocolos que ultrapassam 48 horas ainda faltam consenso, e os riscos podem superar os benefícios.
“Para pessoas saudáveis e bem orientadas, o jejum prolongado pode oferecer efeitos positivos, como melhora da sensibilidade à insulina e redução da inflamação, mas para aqueles com doenças crônicas ou condições específicas, os riscos aumentam. Por isso, o acompanhamento médico é fundamental”, conclui Felipe.