IDiana Tomazelli e Nathalia Garcia
Brasília, DF (FolhaPress)
O Senado está discutindo uma proposta que limita quanto a União pode se endividar. Essa mudança pode complicar o trabalho do Tesouro Nacional e do Banco Central, e também dar mais força ao Congresso em negociações políticas com o governo.
A proposta preocupa economistas e membros do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pois, se aprovada, pode criar riscos econômicos e políticos. Como é um projeto de resolução do Senado, o presidente não pode vetar a medida.
Se o limite da dívida for ultrapassado, a União pode sofrer penalidades, como redução de gastos em pelo menos 25% nos primeiros quatro meses após o estouro do limite. Isso obrigaria o governo a realizar um ajuste difícil na economia.
Rogério Ceron, secretário do Tesouro Nacional, alerta que isso exigiria um ajuste equivalente a mais de 2% do PIB, algo muito difícil de realizar. Já alguns economistas veem a proposta como uma forma de controlar os gastos do governo.
A proposta está em análise na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, e o governo conseguiu adiar a votação para promover audiências públicas. O presidente da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), é o autor da proposta.
O secretário da Casa Civil, Bruno Moretti, explicou que a União usa a emissão de títulos da dívida até para pagar benefícios do INSS. Se o limite for atingido e a emissão de títulos proibida, o pagamento dessas despesas pode ser interrompido, o que gera dúvidas sobre a constitucionalidade da medida.
A situação lembra o que ocorre nos Estados Unidos, onde o Congresso fixa um teto para a dívida e negociações difíceis são frequentes para ampliar esse limite, o que pode interromper serviços públicos por um tempo.
O senador Oriovisto Guimarães (PSDB-PR), relator da proposta, diz que a realidade brasileira é diferente, pois o limite é percentual do PIB e a proposta não causaria apagões nos serviços públicos. Ele sugere que o teto seja de 80% do PIB para a dívida bruta do governo geral, com ajustes para obrigações de estados, municípios e operações do Banco Central.
Em agosto, a dívida bruta estava em 77,5% do PIB, e após os ajustes ficaria em 65,2%. Contudo, o governo prevê crescimento da dívida, o que pode deixar o Executivo vulnerável diante do Congresso.
O governo teme que o Congresso use esse limite para controlar gastos de forma política, especialmente com emendas parlamentares, que têm recebido um valor crescente no Orçamento Federal, sendo R$ 50,4 bilhões só neste ano.
De 2019 a 2021, o governo já precisou de autorização do Congresso para descumprir regras orçamentárias para pagar despesas correntes, mostrando como o Legislativo pode usar esse poder para barganhar projetos e emendas.
Se o limite da dívida for imposto, o Congresso poderá decidir quais despesas podem ou não ser executadas, especialmente em tempos de déficit fiscal, o que cria um problema político sério.
O governo defende que mais importante do que o limite para a dívida são medidas que controlem efetivamente os gastos obrigatórios e garantam sustentabilidade fiscal.
Nos bastidores, o governo critica o Legislativo por pedir ajuste fiscal, mas tomar decisões que aumentam despesas, como derrubar medidas que aumentariam impostos e flexibilizar regras de aposentadoria, o que gera impacto fiscal.
A versão inicial da proposta afetava até as operações do Banco Central, o que poderia reduzir sua capacidade de controlar a inflação. O presidente do BC, Gabriel Galípolo, afirmou que essa mudança seria grande demais para a operação das políticas econômicas.
Apesar dos ajustes na proposta, especialistas como o professor Bruno Carazza, da Fundação Dom Cabral, criticam a medida por aumentar o poder do Congresso sem resolver os problemas das finanças públicas. Ele destaca que o equilíbrio fiscal depende da disciplina de todos os poderes, algo que atualmente falta no Brasil.