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sábado, 27/12/2025

Nova regra para isenção de dividendos gera dúvidas entre especialistas

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MÁRCIA MAGALHÃES
FOLHAPRESS

A nova lei do Imposto de Renda Mínimo, sancionada pelo presidente Lula no dia 26, traz normas que isentam dividendos referentes a lucros até 2025. No entanto, especialistas em tributação apontam que essas regras não estão alinhadas com as leis societárias atuais.

Dividendos são partes do lucro de uma empresa que são distribuídas aos sócios ou acionistas como remuneração pelo investimento feito.

O imposto mínimo de até 10% será cobrado sobre rendas acima de R$ 600 mil por ano e afetará lucros distribuídos a partir de 2026. Os lucros apurados até 31 de dezembro de 2025 terão isenção, desde que a decisão de distribuição seja tomada ainda este ano e o pagamento aconteça até 2028.

Porém, o exercício fiscal, que é o período usado para calcular os resultados financeiros da empresa, só termina em 31 de dezembro. Portanto, de acordo com as práticas contábeis e regras societárias, os lucros só podem ser determinados após essa data, com base no balanço final.

Matheus Moraes, sócio do escritório Garcia Landeiro Carvalho Moraes Advogados Associados, explica que “há um conflito técnico, pois o projeto de lei cria prazos que não estão previstos na legislação atual, gerando incertezas e riscos de disputas judiciais”.

Leticia Schroeder Micchelucci, tributarista do Loeser e Hadad Advogados, diz que é arriscado apurar lucros antes do final do ano fiscal, mesmo usando projeções para dezembro.

O texto da lei permite que os dividendos aprovados em 2025 sejam pagos até 2028, um prazo maior do que o estabelecido pela Lei das Sociedades por Ações (Lei 6.404/76), que exige que a aprovação das contas ocorra até quatro meses após o ano fiscal, e o pagamento dos dividendos em até 60 dias, salvo decisão em contrário.

Micchelucci destaca que, mesmo que a assembleia aprove um prazo diferente, o pagamento deve ocorrer dentro do exercício social.

A rigidez na exigência de seguir exatamente os termos aprovados por estimativas também causa preocupação. Para Verônica Magalhães, advogada tributarista, essa rigidez gera dúvidas sobre possíveis alterações no cronograma.

O projeto tentou evitar manobras ilegais pelas empresas, mas acabou criando uma regra que pode levar as companhias a apresentarem números imprecisos apenas para cumprir obrigações fiscais, segundo Magalhães.

Para as empresas que querem aprovar a distribuição ainda em 2025, os especialistas indicam que a forma segura é basear-se em documentos contábeis oficiais já com valores definidos.

Matheus Moraes alerta que isso exige aprovar números que ainda não são definitivos, o que vai contra princípios contábeis e boas práticas de governança.

Entre as estratégias para garantir a isenção, tributaristas sugerem transformar os lucros acumulados em capital social (capitalização). Assim, o valor entra no patrimônio da empresa e depois pode ser devolvido aos sócios sem imposto, através de redução de capital. Outra alternativa é distribuir parte dos lucros em 2025 para aproveitar a isenção parcialmente.

Matheus Moraes ressalta que o texto deixa dúvidas que dificultam um planejamento fiscal seguro, como a falta de clareza sobre a necessidade da deliberação até o fim de 2025 e quais informações devem constar nessa decisão.

Milton Fontes, tributarista do Peixoto & Cury Advogados, conta que o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) pediu ao presidente o veto ao trecho que condiciona a isenção à deliberação até 31 de dezembro de 2025, mas o pedido não foi aceito.

O CFC afirma que essa exigência é impossível de ser cumprida tecnicamente e juridicamente inconsistente.

Fontes defende que a Receita Federal deve emitir uma orientação oficial para esclarecer como formalizar a distribuição e os critérios para fazer balanços intermediários.

Helena Trentini, advogada, diz que enquanto não houver harmonização das normas, a situação será insegura.

Ela explica que, dependendo do tipo de empresa, seguir o projeto literalmente exigiria práticas contábeis incompatíveis com o fechamento normal das contas ou contrariaria regras básicas da sociedade.

Além dos riscos contábeis e legais, especialistas alertam para possibilidade de multas fiscais e processos jurídicos.

Micchelucci destaca que a lei pode infringir princípios constitucionais, como legalidade, segurança jurídica e irretroatividade, e ser contestada na Justiça.

Magalhães acrescenta que, sem respaldo legal, dividendos pagos depois poderiam ser tributados com alíquota de 35%, conforme a lei.

Segundo Matheus Moraes, o projeto incentiva empresas a adotarem práticas contábeis irregulares, ao aprovarem resultados rapidamente, contrariando normas consolidadas. Para ele, o critério para isenção deveria ser apenas a data da apuração do lucro, não a da deliberação.

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