GABRIEL ALVES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Uma nova terapia experimental para combater a obesidade apresentou resultados iniciais animadores. Nomeada SANA (ácido salicílico nitroalqueno), essa substância parece promover a redução de peso sem afetar o apetite ou causar efeitos colaterais comuns a tratamentos existentes, como perda muscular ou desconfortos digestivos.
Até agora, os efeitos foram observados em camundongos — impedindo o ganho de peso causado por dieta, protegendo o fígado e regulando a glicose — e também em humanos na fase inicial dos testes clínicos. Contudo, para que chegue ao mercado, a droga ainda precisa passar pelas fases 2 e 3 dos estudos clínicos, que envolvem um maior número de participantes.
Publicado na revista Nature Metabolism, o estudo demonstra que o SANA reduziu o peso corporal em cerca de 3% em 15 dias, um desempenho semelhante ao da semaglutida (princípio ativo do Ozempic) nesse mesmo período. Diferentemente deste último, o SANA é administrado em comprimidos duas vezes ao dia, sem necessidade de injeções semanais.
O diferencial do SANA está no seu mecanismo inédito para tratar a obesidade, chamado de ‘termogênese dependente de creatina’. Em testes com camundongos, o medicamento causou perda de peso e evitou o ganho causado por dietas ricas, sem afetar os animais sob dieta regular. Também foi notada uma significativa redução da gordura corporal, aumento da massa magra, além de benefícios ao fígado e melhora na sensibilidade à insulina.
Os estudos com humanos envolvem um ensaio clínico fase 1, duplo-cego e controlado por placebo, com 41 voluntários saudáveis e obesos. Os participantes receberam doses diárias de 200, 300 ou 400 mg, divididas em duas tomadas durante 15 dias. Além da perda de peso, observaram melhora na resistência à insulina e redução da gordura corporal sem perda da massa muscular.
Juliana Camacho-Pereira, pesquisadora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), esclarece o funcionamento do SANA: “As células de gordura estimuladas pelo SANA usam creatina e ATP [trifosfato de adenosina] para gerar fosfocreatina, um processo diferente da termogênese tradicional. Ao contrário de termogênicos clássicos como o DNP, que aumentam perigosamente a temperatura corporal ao bloquear a produção de ATP, o SANA mantém a geração dessa molécula, sendo específico para o tecido adiposo”.
Com liderança dos cientistas do Uruguai, o estudo também contou com colaboração de pesquisadores brasileiros da UFRJ, USP (Universidade de São Paulo) e Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
O ATP é a principal fonte de energia das células, essencial para funções vitais do organismo, como contração muscular e construção de proteínas.
Comparado aos medicamentos agonistas do receptor GLP-1 (semaglutida, liraglutida e tirzepatida) usados no tratamento da obesidade, e que podem causar perda muscular, o SANA preservou e até aumentou a massa magra em animais, abrindo caminho para possíveis combinações terapêuticas.
Embora ainda em estágio inicial, o desenvolvimento de medicamentos como o SANA é visto com otimismo, segundo Levimar Araújo, endocrinologista e professor da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais.
“Este estudo destaca a importância dessas novas drogas, tanto para ampliar as opções quanto para possibilitar combinações terapêuticas. Uma abordagem para emagrecimento baseia-se na termogênese, que queima gordura ao aumentar o metabolismo”, explica. “Até pouco tempo, as opções disponíveis para tratar a obesidade eram limitadas.”
“Esta é a primeira droga que ativa farmacologicamente a termogênese dependente de creatina, oferecendo uma nova alternativa para tratar a obesidade e seus distúrbios metabólicos, complementando os tratamentos com GLP-1, mas focando na capacidade do corpo de queimar energia, não apenas em suprimir o apetite”, afirmou Carlos Escande, pesquisador do Instituto Pasteur de Montevidéu e diretor científico da Eolo Pharma, empresa uruguaia responsável pelos estudos.
“O SANA é fruto de mais de uma década de pesquisa rigorosa na América Latina, com potencial para transformar o tratamento da obesidade e resistência à insulina”, declarou María Pía Garat, CEO da Eolo Pharma.
“Temos orgulho de sermos a primeira empresa de biotecnologia da América do Sul a levar uma molécula inédita desde sua descoberta até os estudos clínicos. Esperamos avançar com essa terapia inovadora para oferecer opções mais seguras e eficazes no combate à obesidade.”