Mulheres que não acompanham o pré-natal apresentam 47% mais probabilidade de ter um bebê com malformações congênitas. Essa informação é resultado de uma pesquisa brasileira que avaliou cerca de 26 milhões de nascimentos entre 2012 e 2020, cruzando dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) e do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM).
O estudo, conduzido por Qeren Hapuk, do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), investigou como fatores biológicos e sociais afetam o surgimento de anomalias congênitas. Essas condições estruturais ou funcionais aumentam o risco de complicações graves para o bebê, incluindo a morte nos primeiros anos.
Entre aproximadamente 144 mil casos identificados, o foco foi dado a oito tipos principais de anomalias: defeitos nos membros, coração, tubo neural, fenda oral, genitais, parede abdominal, microcefalia e síndrome de Down.
Influência da raça, idade e escolaridade
Além da falta de acompanhamento pré-natal, outros aspectos relevantes foram identificados. Mulheres que se identificaram como pretas possuíam 16% mais chance de ter filhos com anomalias em comparação às mães brancas.
A idade também influenciou o risco: gestantes com mais de 40 anos tinham quase 2,5 vezes mais chance, enquanto aquelas com menos de 20 anos tinham um aumento de 13% em comparação com mulheres entre 20 e 34 anos.
O nível de escolaridade mostrou-se crucial. Ter até três anos de estudo elevou em 8% o risco de anomalias congênitas em relação às mães com 12 anos ou mais de ensino formal.
Relação entre tipos de anomalias e fatores específicos
Os pesquisadores encontraram associações entre certas anomalias e fatores particulares. Por exemplo, defeitos no tubo neural foram mais frequentes entre bebês de mães com baixa escolaridade, sem pré-natal e que tiveram gestação múltipla.
Anomalias cardíacas estiveram associadas à idade materna avançada, perdas fetais anteriores e acompanhamento pré-natal inadequado. A síndrome de Down teve forte correlação com gestantes acima dos 40 anos.
Desigualdades regionais e seus impactos
Foi observado também que há variações significativas entre as regiões do Brasil. A qualidade dos registros é maior no Sudeste, enquanto outras áreas, como o Nordeste, enfrentam desafios devido à subnotificação.
No Nordeste, onde há maior concentração de pobreza, ocorreu maior incidência de anomalias como defeitos do tubo neural, relacionados à má alimentação, baixa escolaridade e falta de suplementação adequada.
A epidemia de zika vírus entre 2015 e 2016 também contribuiu para o aumento de casos de microcefalia e outras complicações neurológicas no Nordeste, influenciando os resultados regionais.
Segundo Qeren Hapuk, “Esses dados evidenciam que a desigualdade socioeconômica, associada a fatores biológicos, interfere diretamente na saúde e desenvolvimento dos bebês.” Ela destaca que muitos dos riscos são evitáveis ou podem ser modificados.
A pesquisadora reforça a importância de investir em educação, nutrição, planejamento reprodutivo e facilitar o acesso ao pré-natal, visando diminuir as anomalias congênitas e assegurar um começo de vida mais saudável para todas as crianças, independentemente da região onde nascem.