Quando Kim Jong-un permitiu pela primeira vez que a imprensa norte-coreana mostrasse uma foto de sua filha, conhecida como Kim Ju-ae, em novembro de 2022, muitos pensaram que o objetivo era apresentar o “líder supremo” como um pai cuidadoso e chefe da família.
Ela apareceu vestindo uma jaqueta branca elegante durante um lançamento de teste de míssil balístico intercontinental, sem qualquer sinal de que ela pudesse ser escolhida como futura líder, substituindo seus dois irmãos, em uma nação governada com rigor pela dinastia Kim desde sua criação em 1948 pelo bisavô Kim Il Sung.
Menos de três anos depois de sua estreia na mídia oficial, Kim Ju-ae, hoje com cerca de 12 ou 13 anos, acompanhou seu pai em uma visita a Pequim para assistir ao desfile que comemorou o fim da Segunda Guerra Mundial e se encontrou com os presidentes Xi Jinping da China e Vladimir Putin da Rússia.
Possível herdeira do poder
Especialistas que duvidavam da possibilidade de uma mulher liderar a Coreia do Norte agora consideram que essa missão diplomática pode marcar o início de Kim Ju-ae como sucessora do pai, posicionando-a no cenário político global como representante da única dinastia comunista ainda existente.
“Este é um evento internacional importante e a primeira visita dela ao exterior, o que indica que ela é uma das principais candidatas a suceder seu pai, embora a decisão não esteja confirmada,” explicou Ahn Yinhay, professora de relações internacionais na Universidade da Coreia, em Seul.
Ahn relembra ter ouvido anteriormente que seria impensável para uma mulher assumir o comando de um país que segue tradições rígidas. A Coreia do Norte mantém uma sociedade confucionista, com hierarquias sociais e políticas firmes, onde predomina a autoridade masculina.
Historicamente, a sucessão na dinastia Kim sempre foi masculinizada, mesmo que o filho mais velho nem sempre assumisse, e que rivalidades e intrigas políticas tenham ocorrido.
Kim Ju-ae, contudo, pode romper essa norma. Sinais recentes indicam sua ascensão, como em março último, quando a imprensa oficial a chamou de “uma grande pessoa de orientação,” expressão reservada a líderes experientes do regime.
Até então, ela era referida como a “filha respeitada” do pai e vista frequentemente ao seu lado em eventos oficiais, enquanto ele supervisionava instalações industriais, bases militares e exercícios das Forças Armadas. Pouco se sabe sobre ela, exceto relatos da inteligência sul-coreana que sugerem que gosta de cavalgar, esquiar e nadar.
Um relatório do Serviço Nacional de Inteligência da Coreia do Sul, publicado em janeiro do ano passado, apontou Kim Ju-ae como a sucessora mais provável de Kim Jong-un, apesar das muitas incertezas existentes.
Desafios para uma líder mulher
Embora a vontade do ditador possa ser esta, ainda há dúvidas se a sociedade norte-coreana está pronta para uma mulher na liderança.
Toshimitsu Shigemura, professor da Universidade Waseda, no Japão, acredita que o medo do líder de atentados possa explicar por que mantém a filha por perto, já que um ataque contra ela seria impensável para os EUA. Outra razão pode ser mostrar ao público que é um pai dedicado.
Porém, a tradição confucionista torna mais difícil que uma mulher chegue ao topo político, e é provável que líderes militares e políticos mais velhos resistam à ideia de se submeterem a uma mulher.
Ele aponta que rivalidades ainda desconhecidas podem surgir, e muitos desafios devem ser enfrentados pela jovem candidata.
Apesar disso, Ahn Yinhay acredita que Kim Ju-ae provavelmente seguirá os passos do pai, mas com a possibilidade de ser uma chefe mais gentil e tranquila.