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terça-feira, 23/12/2025

Justiça bloqueia licença ambiental da Samarco por causa das mudanças do clima

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Pedro Lovisi
São Paulo, SP (FolhaPress)

A Justiça Federal, de forma inédita, suspendeu recentemente a licença ambiental que a mineradora Samarco obteve para ampliar seu complexo em Mariana, Minas Gerais, local do desastre ambiental de 2015 que causou 19 mortes.

A juíza Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho aceitou a análise de grupos civis que apontaram que a mineradora não incluiu em seu estudo o impacto de chuvas muito fortes, possíveis devido ao aquecimento global. Esta é a primeira vez que o Judiciário suspende uma licença mineradora mencionando riscos das mudanças climáticas.

A Samarco declarou que ainda não foi informada da decisão e confia no processo legal de licenciamento. Ela pode recorrer.

A Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais também afirmou que não foi notificada e reforçou seu compromisso com as normas ambientais e a proteção ambiental.

O pedido foi feito pelo grupo Loucos por Bento, composto por antigos moradores do distrito destruído pela lama há 10 anos. Eles argumentaram que o estudo da mineradora baseou-se apenas em dados históricos de chuva, deixando de prever chuvas mais intensas.

As regras atuais para licenciamento em Minas Gerais exigem que as mineradoras considerem a maior chuva dos últimos 10 mil anos, baseada em dados antigos fornecidos por órgãos estaduais como a Feam e o Copam.

No caso da Samarco, um relatório do Ministério Público revelou que foram usados dados de chuva entre 1961 e 1990 para definir a maior chuva provável na região, o que é inferior ao volume registrado em enchentes recentes em outras regiões do Brasil.

O documento também destacou que os estudos ambientais não consideraram como as mudanças climáticas podem aumentar eventos extremos de chuva, nem utilizaram metodologias que combinam dados históricos com cenários futuros para adaptar o projeto a esses riscos.

Um relatório feito pelo cientista Mark Chernaik, da Environmental Law Alliance Worldwide, afirma que há grande certeza de que o ciclo de chuvas em Minas Gerais entre 2029 e 2037 será diferente do histórico.

O projeto inclui a construção de uma barragem e um depósito de rejeitos secos, essenciais para os planos de expansão da Samarco, que é uma parceria entre a Vale e a BHP.

Especialistas dizem que a decisão pode abrir caminho para que outras licenças ambientais sejam revistas pela Justiça, o que geraria muitas reclamações das mineradoras.

“A incerteza para o setor produtivo cresce. Mas até que ponto o Judiciário deve intervir? Isso pode retirar a responsabilidade dos órgãos técnicos”, disse Regina Barbosa, advogada especialista em direito ambiental.

Ela acrescentou que essa intervenção obriga os órgãos reguladores a acelerar seus processos para manter sua autoridade técnica.

A juíza destacou que sua decisão questiona a legalidade de atos já realizados e citou que as barragens de Mariana e Brumadinho, que romperam em 2015 e 2019, foram licenciadas com base nos padrões técnicos da época.

Organizações e ambientalistas celebraram a decisão. Julio Grilo, ex-superintendente do Ibama em Minas Gerais, espera que ela sirva de exemplo para outros casos.

“A crise climática traz chuvas extremas muito maiores do que antes. Precisamos ao menos dobrar os valores de precipitação usados nos estudos de impacto”, afirmou. “Se uma barragem romper devido a chuvas fortes, as mineradoras podem dizer que seguiram a lei e que a chuva não foi prevista.”

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