Nos últimos 40 anos, Sérgio Abranches observou atentamente o avanço institucional do Brasil após a ditadura. O cientista político enxerga um ponto de amadurecimento democrático no julgamento atual no Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga a tentativa de golpe de Estado ocorrida em 8 de janeiro de 2023.
“É a primeira vez que um ex-presidente da República e generais na ativa são julgados por um tribunal civil por tentativa de golpe. Isso é um acontecimento muito relevante e vai estabelecer um precedente que indica uma nova fase na vida institucional da democracia brasileira”, analisa Abranches, em entrevista.
Contexto histórico e significado
Diferente de países vizinhos como Argentina e Chile, o Brasil não realizou uma justiça de transição para crimes cometidos por militares durante a ditadura (1964 – 1985), perdoados pela Lei da Anistia de 1979. O reconhecimento dos militares em funções civis e seu julgamento por tribunal civil representou uma mudança notória na história jurídica e institucional nacional.
Abranches destaca a reação das Forças Armadas frente ao julgamento que inclui generais como réus, observando um retorno ao controle interno após um período de conflito e quebra de hierarquia durante o governo anterior.
Significado político e social
O cientista político vê no STF um exemplo para o mundo em um período de crescimento da extrema direita em vários países, demonstrando que tais movimentos podem ser enfrentados com instituições fortes e ações adequadas.
Observando a situação atual do Executivo e Legislativo, há críticas à fragmentação e falta de coalizões efetivas no Congresso, além de reprovação a propostas de anistia amplas que ameaçam a seriedade institucional.
Repercussões e perspectivas
A mobilização política em defesa da anistia e atos contra o STF, como o protagonizado por Tarcísio de Freitas, mostram estratégias dentro do campo bolsonarista, que para Abranches podem comprometer suas chances eleitorais futuras.
Além disso, o enfraquecimento da extrema direita sem a liderança de Jair Bolsonaro é projetado, e a polarização política brasileira parece diminuir com parte da população afastando-se das posições extremas.
O cientista também faz comparações internacionais sobre o impacto das transformações econômicas e tecnológicas nas manifestações da extrema direita, destacando características específicas do Brasil.
Quanto à guerra comercial entre os Estados Unidos e Brasil, Abranches avalia um cenário desfavorável para o governo americano, prevendo dificuldades políticas e econômicas para o presidente Donald Trump. O cientista político acredita que a postura brasileira equilibrada no diálogo com Washington é a correta.
Por fim, Abranches projeta a reeleição do presidente Lula impulsionada pelas circunstâncias políticas atuais, e acredita que tentativas de interferência estrangeira provavelmente terão efeito contrário ao esperado.