Victoria Azevedo e Fábio Pupo
Brasília, DF (Folhapress)
A rejeição de diversos vetos presidenciais que beneficiavam empresários do setor elétrico e aumentavam a conta de luz criou um ambiente de descontentamento dentro do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e entre deputados e senadores da base aliada. Essa situação evidenciou falhas na articulação política e revelou uma disputa de responsabilidade entre ministérios e líderes do Congresso sobre o desfecho.
No âmbito governamental, assessores indicam que o Palácio do Planalto falhou na gestão do processo, especialmente pela demora na análise de uma minuta de medida provisória (MP) do Ministério de Minas e Energia, que buscava um acordo intermediário com redução de subsídios e alívio na tarifa energética para parlamentares.
Conforme reportado pela Folha, essa minuta permaneceu retida no Palácio do Planalto e não foi enviada a tempo para a votação. Após a derrubada dos vetos, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), comunicou o envio da MP. Contudo, parte do Executivo segue cética quanto à eficácia da medida, que originalmente poderia reduzir os efeitos dos dispositivos ‘jabutis’ em até 83%.
A Secretaria de Relações Institucionais (SRI), sob a liderança de Gleisi Hoffmann e responsável pela articulação política do Planalto, emitiu uma nota dois dias após a votação, informando que foi surpreendida por um acordo improvável, organizado pela liderança do governo no Congresso. A SRI afirmava inicialmente que somente alguns vetos relativos ao programa Proinfa, que beneficia fontes alternativas, seriam derrubados, mas alegou que outros itens foram incluídos inesperadamente.
No comunicado, a SRI afirmou: “Fomos pegos de surpresa com a adição, em última hora, de dispositivos como PCHs, parques eólicos no Rio Grande do Sul, usinas de hidrogênio no Nordeste e relicitação de termelétricas”. Segundo a pasta, esses casos exigiam um acordo mais amplo.
Randolfe, por sua assessoria, declarou ter sido consultado para a elaboração da nota e que concordou com seu conteúdo. Nem a Casa Civil nem a SRI forneceram respostas adicionais.
Conforme declarado por uma fonte política, pouco antes da sessão no Congresso, os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Gleisi se reuniram com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e lideranças, incluindo Randolfe, numa tentativa de impedir a votação do veto relativo às usinas eólicas.
Devido aos protestos das lideranças de partidos centristas, foi estabelecido um acordo para ampliar os dispositivos do veto a serem derrubados. Segundo relatos, o governo indicou o envio da MP, mas sem o texto disponível, optou-se por derrubar os vetos para posteriormente avaliar a proposta.
Randolfe recebeu críticas por sua condução da sessão de votação, inclusive de aliados parlamentares. Congressistas relataram que até véspera da sessão não estavam claros os acordos firmados.
Diversos líderes declararam na véspera que a deliberação sobre os itens da energia ficaria para outra sessão. Contudo, à noite, circulou informação entre eles de que os itens poderiam ser votados no dia seguinte.
Na manhã de terça-feira (17), horas antes da votação, foi divulgado que cinco vetos de energia seriam derrubados em acordo.
Ao abrir a sessão, Alcolumbre anunciou ainda a derrubada de mais três vetos, totalizando oito vetos do presidente Lula na área energética derrubados apesar da recomendação contrária de vários ministérios.
Deputados do PT expressaram desagrado com Randolfe em grupo de WhatsApp da bancada, afirmando falta de explicação sobre o teor dos vetos e suas consequências. Pelo menos quatro ministérios do governo se posicionavam contrariamente desde o início do ano, principalmente por causa do aumento da conta de energia.
Um deputado, sob anonimato, mencionou um ambiente de quebra de confiança em relação a Randolfe. Também houve queixas de parlamentares que seguiram orientações do governo terem sido criticados nas redes sociais, enquanto Randolfe se absteve de votar.
O PT votou majoritariamente a favor da derrubada dos vetos, com percentual superior ao de partidos como o PL de Jair Bolsonaro. Já PSOL, Novo, PV e Rede se posicionaram totalmente a favor da manutenção dos vetos.
Apesar do episódio, governistas minimizam, alegando que o Executivo enfrenta desafios no Congresso pela falta de uma base aliada consolidada. Defendem que os parlamentares buscaram evitar derrotas expressivas ao Planalto, mas que algumas concessões eram esperadas.
A sessão ocorreu em contexto de insatisfação geral com o Executivo, especialmente pela demora na liberação de emendas parlamentares para 2025 e de recursos aprovados anteriormente.
Na véspera da sessão, a Câmara já havia imposto uma derrota ao governo ao aprovar a urgência para projeto que revoga novo decreto do IOF editado pelo Executivo.
Há consenso de que, se a MP do Ministério de Minas e Energia tivesse sido enviada antes ao Congresso, a análise dos vetos poderia ter sido evitada. A medida foi discutida em reunião no dia seguinte à sessão, com a presença de Rui Costa, Gleisi, Davi Alcolumbre e líderes do Senado na residência oficial da presidência do Senado em Brasília.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, manteve uma postura distante nas negociações. Embora defenda a manutenção dos vetos, afirmou que a responsabilidade pela articulação política era da Secretaria de Relações Institucionais.