IGOR GIELOW
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
As forças de Israel realizaram nesta segunda-feira (23) uma operação de grande escala contra instituições do aparato repressivo da teocracia no Irã, indicando que a intenção de desestabilizar o governo de Teerã pode estar se tornando realidade.
De acordo com o ministro da Defesa do Estado de Israel, Israel Katz, as forças militares “estão atacando alvos do governo e agentes repressivos no centro de Teerã, com uma força jamais vista”. Ele mencionou em comunicado diversos objetivos políticos.
Entre os alvos está a base da milícia Basij, uma temida entidade ideológica e religiosa da Guarda Revolucionária, o grupo militar mais influente do país. Ao longo dos anos, esta milícia foi acusada por ativistas de praticar execuções extrajudiciais e torturas, além de impor à força as regras islâmicas do regime.
Também foi atingida a prisão de Evin, conhecida por abrigar presos políticos – até o momento não há confirmação se houve vítimas fatais entre esses detentos. A ação envolveu o uso de mais de 50 aviões.
Outros locais atacados incluem a sede do serviço de segurança interno, o departamento de ideologia governamental e um símbolo detestado em Tel Aviv: o Relógio da Destruição de Israel, que marca a contagem regressiva para o fim do Estado judeu em 2040.
A questão da mudança do regime permeia o ataque iniciado por Israel na última sexta-feira (13), ao qual os Estados Unidos aderiram no final de semana. As Forças de Defesa do país afirmam ter como objetivo apenas acabar com o programa nuclear iraniano e neutralizar ameaças militares – destruíram virtualmente a defesa aérea, eliminaram lideranças militares e continuam a atingir sistemas de mísseis e fábricas.
No entanto, desde o início, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu declarou que a queda do regime teocrático seria um resultado desejado desta campanha. Integrantes radicais do governo, como Katz, afirmam que desestabilizar o regime é uma das prioridades da missão.
O presidente dos EUA, Donald Trump, adicionou tensão ao ameaçar recentemente o líder do regime, o aiatolá Ali Khamenei, de morte. Embora tenha recuado, entrou no conflito dois dias depois. No domingo à noite, comemorando o que considerou sucesso no ataque, postou em redes sociais sugerindo o colapso da República Islâmica.
“Não é politicamente correto usar o termo mudança de regime, mas se o atual governo iraniano é incapaz de FAZER O IRÃ GRANDIOSO NOVAMENTE, por que não haveria mudança? MIGA!!!”, escreveu, adaptando seu slogan político “Make America Great Again” para o Irã.
Além disso, Trump traçou um caminho para o fim do conflito ao atacar com precisão a fortaleza nuclear de Fordow e outros dois pontos críticos do programa iraniano, ainda que o objetivo de eliminar a capacidade de fabricar uma bomba atômica pareça distante.
Ele afirmou que o Irã deveria retomar imediatamente as negociações de paz, proposta rejeitada pelo regime como um ultimato armado. A mudança no governo iraniano é complexa, especialmente devido à desorganização da oposição, levantando dúvidas sobre o futuro do país.
Apesar disso, há crescente insatisfação popular com o regime, evidenciada por protestos recentes. Um ativista em Teerã compartilhou com a Folha na semana passada que atacar o centro de poder e as forças repressivas seria uma forma de incentivar os opositores, estratégia que Israel parece estar adotando.
Caças israelenses voltam a atacar instalações nucleares
Além dos ataques contra o regime, caças de Tel Aviv atingiram alvos militares, aeroportos e retornaram à base de Fordow, uma das mais importantes do programa nuclear iraniano. Presume-se que, após a abertura de buracos com bombas superpesadas GBU-57 lançadas pelos EUA, seja possível ampliar os danos no local.
A extensão do prejuízo é tema de debate entre especialistas e militares. O chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, Dan Caine, afirmou que ainda é cedo para avaliar, enquanto Trump e outros governantes celebram a destruição total de Fordow e das centrais de Isfahan e Natanz.
Trump afirmou nesta segunda-feira estar certo da destruição dos locais e criticou jornalistas que questionaram a dimensão do dano, usando os habituais insultos contra a mídia.
O diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, declarou que embora ninguém conheça a realidade completa, o ataque sugere prejuízos severos. “Pela quantidade de explosivos usados e pela sensibilidade das centrífugas às vibrações, esperamos danos significativos”, afirmou em reunião da ONU.
O Irã minimizou os impactos, alegando que o material radioativo já não estava mais na localidade. Antes de romper com a AIEA, após um relatório acusar o país de falta de transparência, o Irã dispunha de 400 kg de urânio enriquecido a 60%, nível próximo ao utilizado em bombas atômicas (80%) e suficiente para criar armas sujas, que espalham radiação mortal sem causar grande explosão.
“Qualquer movimentação de material nuclear protegido para outro local no Irã precisa ser comunicada à agência”, afirmou Grossi, que pediu acesso dos técnicos da AIEA aos locais atacados.
Antes do ataque, Netanyahu declarou ter informações confiáveis sobre o destino do urânio, mas não se sabe como teria sido possível bombardear o local sem causar desastre radioativo, levantando a hipótese de intervenção por forças especiais israelenses em solo.
Na manhã seguinte, o Irã respondeu com um ataque de mísseis contra Israel, embora com menor intensidade, lançando apenas dez projéteis. Segundo Tel Aviv, todos foram interceptados, mas as sirenes de alerta continuam soando no país durante o dia.