ADRIANA FERNANDES E MARCELO ROCHA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Reuniões do Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS) realizadas há duas décadas já apontavam problemas nos descontos de empréstimos consignados em aposentadorias e pensões do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Na reunião de outubro de 2005, que foi a 115ª ordinária do conselho, os membros discutiram essas irregularidades enquanto o crédito consignado ainda estava em início de uso.
Segundo técnicos do INSS, a origem das cobranças indevidas está ligada justamente ao começo dessa modalidade de empréstimo, que utiliza as aposentadorias e pensões como garantia para pagamento.
Um técnico, mencionando o escândalo atual envolvendo descontos indevidos associados a entidades sindicais, afirmou que esse problema tem relação com as irregularidades detectadas há mais de 20 anos.
Na reunião, representantes da Ouvidoria do Ministério da Previdência alertaram para o aumento do número de casos nos quais beneficiários do INSS sofriam descontos não autorizados em seus benefícios.
Foi destacado que as reclamações sobre empréstimos consignados certos beneficiários não haviam autorizado chegavam a representar 15,7% das queixas recebidas entre julho de 2004 e setembro de 2005.
A preocupação da Ouvidoria era informar corretamente os beneficiários, principalmente idosos e pessoas com deficiência, para que usassem o crédito consignado de forma consciente.
Benedito Brunca, então representante do INSS no CNPS e atual secretário do RGPS no Ministério da Previdência, atualizou o conselho sobre as normas que regulamentam os empréstimos consignados autorizados pela Lei 10.820, de 2003.
Ele mencionou regras como o prazo de até 36 meses para quitação e a proibição da contratação do empréstimo por telefone.
Naquele tempo, apenas instituições que pagavam benefícios podiam fazer convênios para descontos em folha; depois, essa possibilidade foi ampliada para qualquer instituição financeira. O Banco BMG, envolvido no escândalo do Mensalão, era o maior operador então.
O ministro da Previdência de 2005, Nelson Machado, que participou da reunião, explicou que os descontos associativos são diferentes do empréstimo consignado e que os problemas no início do consignado foram discutidos com o setor bancário para serem resolvidos.
Ele comentou que bancos terceirizavam a contratação do crédito, o que dificultava o controle, e que o sistema bancário implementou autorregulação para fiscalizar o processo até hoje.
Em outra reunião do CNPS, em junho de 2010, Evandro José Morello, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), expressou preocupação com fraudes envolvendo documentos falsificados usados para obter empréstimos consignados e pediu maior segurança na colaboração dos bancos.
Hoje, a Contag está entre os alvos das investigações sobre descontos indevidos, mas afirma pautar sua atuação pela legalidade.
O atual presidente do INSS, Gilberto Waller Junior, tomou várias medidas para combater fraudes, como exigir biometria facial para desbloqueio de benefícios para empréstimos e suspender empréstimos feitos por representantes legais sem autorização judicial, além de descredenciar instituições que não seguem as regras.
O INSS também firmou parceria com a Secretaria Nacional do Consumidor para monitorar reclamações de consumidores.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) declarou não ter registros de problemas em atas do CNPS nos últimos 20 anos, ressaltando que bancos não compactuam com fraudes e que estão atuando através da autorregulação do consignado para eliminar práticas inadequadas.
Desde 2020, essa autorregulação prevê sanções para práticas ilícitas, e várias medidas administrativas já foram aplicadas contra correspondentes bancários e agentes de crédito que descumpriram as normas.
A operação Sem Desconto, conduzida pela Polícia Federal e Controladoria-Geral da União, focou nos descontos indevidos associados, mas também investigou irregularidades na concessão dos empréstimos consignados, especialmente possíveis ligações com descontos feitos por sindicatos e entidades de classe.