LEONARDO VIECELI
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS)
Ao longo de três décadas, o setor de indústria extrativa ampliou sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em seis vezes, enquanto o setor da construção civil teve sua representatividade reduzida pela metade, segundo informações do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Os dados que vão de 1995 a 2024 mostram que o peso da indústria extrativa, que abrange mineração e petróleo, aumentou de 0,7% para 4,2%. Já a construção civil diminuiu sua fatia de 7% para 3,6%. A indústria de transformação também teve redução, de 16,8% em 1995 para 14,4% em 2024, permanecendo como o principal ramo industrial.
A indústria de transformação é responsável pela conversão de matérias-primas em produtos diversos, incluindo alimentos, calçados, vestuário, máquinas e veículos. Além disso, o cálculo do PIB industrial considera ainda os setores de eletricidade, gás, água, esgoto e gestão de resíduos, cuja participação subiu de 2,4% para 2,6% no período.
Segundo o IBGE, as variações percentuais levam em conta valores correntes, que refletem tanto a quantidade produzida quanto as mudanças nos preços de cada setor. A perda de participação em um determinado ano não indica necessariamente queda na produção, mas pode ser resultado de um crescimento mais lento em comparação a outros setores.
Marcelo Azevedo, gerente de análise econômica da CNI (Confederação Nacional da Indústria), destaca que o baixo investimento em infraestrutura no Brasil, devido a problemas regulatórios e restrições fiscais, limitou o avanço da construção civil. Além disso, o setor enfrentou dificuldades com a instabilidade do mercado imobiliário e juros altos, que encarecem financiamentos.
Por outro lado, a indústria extrativa foi impulsionada pela alta demanda e valorização das commodities no mercado internacional, aumentando os investimentos e produção nesse segmento. O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, ressalta o efeito das exportações para a China e o crescimento da indústria petrolífera, especialmente desde o início da exploração comercial do pré-sal em 2008.
Enquanto isso, a construção e a indústria de transformação foram mais afetadas pelas instabilidades econômicas nacionais, com períodos prolongados de queda na atividade da construção e baixa demanda interna, aponta o IBGE.
Desindustrialização no Brasil
A indústria como um todo reduziu sua participação no PIB de 27% em 1995 para 24,7% em 2024. Em contrapartida, o setor de serviços cresceu de 67,2% para 68,8%, e a agropecuária também aumentou sua parcela, de 5,8% para 6,5%.
Gustavo Inácio de Moraes, professor da Escola de Negócios da PUC-RS, comenta que a desindustrialização brasileira ocorreu em um contexto de renda per capita mais baixo do que em outros países, e que o Brasil vem se especializando em indústrias relacionadas ao agronegócio. Ele também aponta a reforma tributária como possível fator positivo para o setor industrial futuro.
Segundo dados do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), ajustados pela inflação, a participação da indústria de transformação caiu de 17,2% para 10,8% no período. Essa proporção já havia atingido 21,4% na década de 1970.
Rafael Cagnin, diretor-executivo do Iedi, observa que o país não conseguiu criar condições para agregar valor progressivamente na cadeia produtiva, resultando em crescimento lento da transformação industrial frente ao restante da economia. Entre os desafios enfrentados estão juros elevados e o chamado “Custo Brasil”, incluindo tributação complexa, burocracia e infraestrutura deficiente. A construção civil também foi prejudicada por esses fatores.
Cagnin considera que a perda industrial no Brasil foi rápida e precoce, diferente do ritmo observado em países desenvolvidos, e defende a redução do custo Brasil e acordos comerciais, como os firmados entre Mercosul e União Europeia, como prioridades para o setor.
Desafios e perspectivas
A revitalização da indústria é um foco do governo atual, que apresenta um plano específico para o setor. Entretanto, especialistas ressaltam que o cenário de juros altos e incertezas no comércio externo dificulta o crescimento industrial.
Marcelo Azevedo afirma que, enquanto a taxa de juros permanecer elevada, será difícil manter o ritmo de expansão da indústria. Rafael Cagnin reforça que reduzir o custo Brasil é fundamental, já que, diante de incertezas, a competitividade será decisiva para os empreendimentos industriais.
Sergio Vale complementa que não é viável para o Brasil produzir todos os tipos de bens, sendo estratégico explorar nichos com potencial, especialmente ligados à transição energética. Ele destaca o avanço tecnológico presente na indústria do petróleo e da extração do pré-sal como indicação de um segmento com perspectivas positivas.
Vale também ressalta a importância de melhorar a educação para qualificar a mão de obra e acompanhar as transformações tecnológicas previstas para o futuro, além de promover a redução dos custos produtivos como forma de fortalecer o setor industrial no país.