Por Maria Clara Britto
Receber o diagnóstico de câncer já é um momento muito difícil. Quando junto a ele vem a notícia da possibilidade de infertilidade, o impacto emocional é ainda maior, algo que especialistas chamam de “duplo choque”.
A psicóloga Gláucia Flores, especialista em psicologia oncológica pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA/RJ), explica que ter que lidar com o câncer e a chance de não poder ter filhos gera um sofrimento grande, principalmente para quem desejava formar uma família.
“Quando essa notícia de câncer vem junto com a possibilidade de ficar infértil, esse sofrimento se intensifica, principalmente naquelas mulheres ou casais que pretendiam ter filhos.”
Ela conta que esse momento é como um luto: não se perde só a saúde, mas também planos e sonhos de vida.
“Muitos pacientes vivem luto pela doença, pela perda da saúde e pela possibilidade de não terem filhos. São diferentes perdas que precisam ser compreendidas e enfrentadas.”
Os sentimentos comuns nessa fase incluem medo, tristeza, ansiedade, frustração e até culpa. Gláucia destaca que alguns pacientes procuram um motivo para o que aconteceu, questionando-se sobre o que fizeram de errado.
Além do desgaste emocional, a autoestima e a identidade pessoal também são afetadas. Muitas vezes, questões ligadas à feminilidade e masculinidade surgem junto com a frustração pelos planos interrompidos.
Mesmo quem não tinha planos para ter filhos no momento sente a perda da escolha. Gláucia Flores comenta:
“Alguns dizem: tudo bem, eu não queria ter filhos, mas agora nem posso escolher. Quando se é jovem, pode mudar de ideia depois. A perda da escolha também traz sofrimento.”
Suporte e rede de apoio
A maneira como os profissionais de saúde anunciam essa notícia pode ajudar a diminuir o impacto emocional.
“Profissionais que mostram sensibilidade e empatia são lembrados, mesmo nos momentos difíceis. É importante usar uma linguagem clara, respeitosa e estar pronto para esclarecer dúvidas”, destaca Gláucia.
Apoio de amigos, familiares e parceiros é essencial para ajudar esses pacientes a enfrentar essa fase difícil.
“Ter pessoas próximas que ouvem sem julgar, que oferecem suporte emocional e prático, faz grande diferença.”
A psicóloga também reforça a necessidade de ajuda psicológica para os familiares, que também passam por dificuldades.
“A família pode se sentir perdida e precisa de apoio psicológico. Parceiros compreensivos reduzem sentimentos negativos e fortalecem os laços. A rede de apoio é fundamental.”
Diferenças entre homens e mulheres
O impacto da notícia pode variar entre mulheres e homens.
Gláucia Flores explica que as mulheres podem sentir uma pressão social maior relacionada à maternidade e feminilidade. Já os homens tendem a viver a dor mais silenciosamente, enfrentando dificuldades para expressar emoções e sentimentos. Eles podem associar a infertilidade à perda de virilidade.
A cultura, a idade, o desejo de ter filhos e o suporte social influenciam como cada pessoa enfrenta essa situação.
A vida após a cura
Mesmo após o término do tratamento e a cura, a infertilidade pode deixar marcas emocionais e físicas duradouras.
“São sequelas que afetam a autoestima e a identidade, mas é importante lembrar que o valor pessoal não depende apenas da capacidade de ter filhos.”
O acompanhamento psicológico ajuda a reconstruir a autoestima e a encontrar novos caminhos para a vida.
Gláucia Flores orienta para quem está começando o tratamento:
“Buscar informação de qualidade alivia a ansiedade. Dividir sentimentos com a família e parceiros, e procurar apoio psicológico são passos importantes. É um momento difícil, mas não é preciso passar por ele sozinho. Informação, acolhimento e apoio são essenciais para superar essa fase e encontrar novas formas de realização.”
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira