Ora, a julgar por sua experiência histórica, portanto, o Brasil possui o interesse de promover um desenvolvimento mais equitativo da economia global, cujos ganhos possam ser auferidos não somente pelos países mais ricos do sistema, como também pelos países do Sul Global.
Por conta disso, desde o início dos anos 2000 o Brasil (juntamente com outros Estados importantes como Índia e África do Sul) já declarava sua intenção de reformar os institutos internacionais nos quais o G7 detinha dominância, a fim de reduzir o grande desequilíbrio no poder decisório entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento.
No FMI, por exemplo, o G7 detém atualmente 41,2% do poder de voto, com as nações europeias estando sobrerepresentadas se analisarmos sua contribuição percentual para o PIB global. Em vista disso e como resultado do discurso encabeçado pelo Brasil, em prol de uma maior voz para os países emergentes nos processos de tomada de decisão global, foi que surgiu o BRICS no ano de 2009 e posteriormente o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) no ano de 2015.
Tanto o BRICS quanto o NBD são justamente os símbolos da inquietação sentida pelo Brasil e por diversos outros países quanto à ineficiência da gestão financeira internacional dos países do G7 que, em última instância, foi a responsável pela grande crise financeira de 2008.
Não sem razão, a política externa do Brasil também não mediu esforços para tornar o G20 (grupo no qual participam países desenvolvidos e em desenvolvimento) no principal foro de discussões para a governança da economia mundial, realidade essa que acabou felizmente consolidando-se.
Com efeito, a relativa força dos Estados pertences ao G7 durante os anos 1990 e meados dos 2000 residia – em parte – na falta de coordenação política existente entre as econômicas emergentes. Hoje, contudo, essa coordenação já se faz presente e é representada justamente pelo BRICS e pelo G20.
Para além do já exposto, estimativas do próprio FMI indicam que em 2030 a contribuição do BRICS para o PIB mundial em termos de paridade do poder de compra (PPC) será de mais de 50%, diminuindo consideravelmente o peso econômico dos países do G7.
Claro que essa realidade não poderia agradar aos anseios hegemônicos dos países ocidentais, que farão o possível para retardar esse processo.
Além do mais, como o conflito na Ucrânia veio a demonstrar, as instituições internacionais sob controle dos países do G7 foram utilizadas como ferramenta de pressão política e econômica contra a Rússia, no intuito de modificar a política externa daquele país.
Ficou evidente, portanto, que: se esses mecanismos podem ser usados para chantagear a Rússia (uma das principais grandes potências do globo), eles podem ser usados para chantagear qualquer outro país do sistema. Por fim, pouco tempo depois de Lula ter (re)assumido a presidência brasileira, determinados articulistas nos Estados Unidos defendiam a ideia de que o Brasil deveria afastar-se do BRICS.
Segundo eles, o Brasil não deveria aproximar-se politicamente de governos tidos como “autoritários”, característica essa frequentemente associada aos governos de Rússia e China. Na visão do Ocidente, em suma, o governo brasileiro deveria esquecer o BRICS e envolver-se com países com os quais compartilha de valores democráticos comuns, como no caso do G7.
Apesar do belo invólucro, esse tipo de discurso visa na verdade distrair o Brasil de um de seus objetivos principais em política externa, que é justamente o de “democratizar” as relações internacionais.
Ora, são exatamente as democracias ocidentais representadas pelo G7 que lutam pelo congelamento do poder mundial, enquanto países como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul têm se coordenado para mudar esse quadro, buscando uma configuração mais justa na tomada de decisão global.