IDIANA TOMAZELLI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Em julho, os membros da Advocacia-Geral da União (AGU) receberam R$ 2,34 bilhões em honorários de sucumbência, pagamento este que atingiu um recorde mensal e beneficiou cerca de 12 mil servidores, conforme divulgado no Portal da Transparência.
Esse repasse veio após um pagamento extra de R$ 1,7 bilhão realizado no início do ano. De janeiro a julho de 2025, os profissionais da AGU receberam aproximadamente R$ 5 bilhões em remunerações adicionais, de acordo com dados reunidos pela Folha.
No mês de julho, referente aos pagamentos de junho, a média recebida ficou perto de R$ 192 mil, sendo que quase metade dos servidores ganhou valores próximos a R$ 310 mil. Esse grupo inclui o ministro chefe do órgão, Jorge Messias, que além dos R$ 193,2 mil recebidos em janeiro, levou outros R$ 307,9 mil em julho só de honorários, sem contar o salário de ministro.
Os repasses são feitos por uma entidade privada chamada Conselho Curador dos Honorários Advocatícios (CCHA), cujos membros, responsáveis pela decisão da distribuição das verbas, também são beneficiados. O presidente do CCHA, Julio Monte, recebeu R$ 157,7 mil em julho, após ganhar R$ 125,1 mil em janeiro.
Parte significativa desse montante pago em julho resulta de uma decisão do colegiado que determinou o pagamento do terço de férias sobre o valor dos honorários, com efeito retroativo.
Anteriormente, o cálculo considerava apenas o subsídio fixo mensal dos advogados, mas uma resolução recente, ainda não divulgada publicamente, passou a incluir os honorários nesse cálculo.
Esse entendimento foi aplicado também a anos anteriores, causando pagamentos retroativos de grande volume, que não ficam sujeitos ao limite salarial do funcionalismo, hoje fixado em R$ 46.366,19 ao mês. O conselho afirma que sobre esses repasses é descontado 27,5% de Imposto de Renda.
Os membros da AGU defendem que, considerando o mês em que o pagamento deveria ter ocorrido, os valores estariam dentro do teto salarial, aproveitando assim espaços deixados por remunerações inferiores no passado para realizar acréscimos retroativos sempre que há recursos extras no fundo gerido pelo CCHA.
Esse elevado pagamento de honorários atraiu críticas de integrantes do governo, de outras categorias e do público em geral. Em resposta, a AGU tem buscado mais transparência nas informações após um período com divulgação limitada dos dados.
No final de julho, Messias publicou uma portaria que criou um novo painel de dados detalhando os pagamentos realizados e os motivos de cada repasse.
Esse painel foi lançado recentemente e revela detalhes antes desconhecidos, como a divisão dos valores recebidos em parcelas distintas e suas justificativas.
Antes, o Portal da Transparência mostrava apenas os valores agregados com uma descrição geral do motivo do pagamento. Agora, é possível acessar o montante pago para cada tópico.
Por exemplo, Messias recebeu em julho R$ 272 mil referentes a anos anteriores, sendo R$ 101,6 mil de complementação de férias e R$ 170,4 mil de juros e correção monetária. Além disso, obteve R$ 14,1 mil do rateio ordinário, R$ 16,6 mil de terço de férias de 2025, R$ 4.200 de auxílio-saúde e R$ 1.000 de auxílio-alimentação.
O presidente do CCHA também recebeu R$ 121,8 mil retroativos, incluindo R$ 53,7 mil de juros e correção, R$ 14,1 mil de rateio ordinário, R$ 16,6 mil de terço de férias e R$ 5.200 em auxílios.
Na segunda-feira, 1º de agosto, o chefe da AGU baixou outra portaria para implementar uma estrutura de governança para acompanhar as atividades do CCHA, possibilitando que o Conselho Superior da AGU recomende medidas como auditoria externa independente e criação de comissão de ética no conselho.
Já foi expedida uma recomendação para que o CCHA elabore uma resolução proibindo a criação de novos direitos e vantagens com efeitos retroativos, exceto por decisões judiciais definitivas.
Também foi recomendado que a criação de pagamentos indenizatórios seja submetida à análise anterior do Conselho Superior da AGU. Tais verbas, conhecidas como penduricalhos, não se submetem ao teto salarial, independentemente do momento do pagamento.
Essas recomendações, porém, são facultativas, e o CCHA pode optar por segui-las ou não. O ministro enfrenta resistência dentro da categoria para ampliar a transparência dos honorários.
A AGU não se manifestou para esta reportagem, mas anteriormente afirmou que as decisões de pagamento são responsabilidade exclusiva do conselho e que defende a transparência. O CCHA também já anunciou planos para ampliar a divulgação das informações.
Os honorários de sucumbência foram instituídos em 2016 como um bônus pago aos servidores jurídicos do Executivo pela defesa dos interesses da União. Beneficiam os advogados da AGU e procuradores da PGF, PGFN e do Banco Central.
O pagamento desses honorários é impulsionado por transações tributárias adotadas pelo governo para aumentar a arrecadação e cumprir metas fiscais.
A lei que instituiu esses pagamentos inclui na base dos cálculos não só os honorários pela atuação judicial, mas também uma fração dos encargos sobre débitos inscritos em dívida ativa da União, independentemente da contestação judicial.
A dívida ativa é composta por tributos, contribuições sociais e outros débitos em atraso, cuja cobrança cabe à PGFN, vinculada à AGU.
Com apoio do ministro Fernando Haddad (Fazenda), a PGFN tem aumentado o uso de transações tributárias para regularizar dívidas, oferecendo descontos e condições de parcelamento que aumentam a arrecadação e, consequentemente, os honorários, embora os servidores argumentem que os encargos muitas vezes são reduzidos significativamente nesses acordos.