ALEX SABINO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Especialistas apontam que os governos podem tirar importantes ensinamentos com a concessão do túnel Santos-Guarujá. O objetivo é que futuros leilões de grandes obras tenham mais concorrência e menos uso de recursos públicos.
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), comentou que o desconto oferecido pela empresa vencedora foi pequeno.
Na última sexta-feira (5), a empresa portuguesa Mota-Engil venceu a concessão do projeto, que tem orçamento de R$ 6,8 bilhões, com R$ 5,14 bilhões divididos entre o governo federal e o de São Paulo.
O critério para ganhar era apresentar o menor valor de pagamento anual ao governo paulista. O edital previa R$ 438,30 milhões, e a Mota-Engil ofereceu um desconto de apenas 0,5% (R$ 2,2 milhões).
A Mota-Engil venceu porque a única concorrente, a espanhola Acciona, não apresentou desconto.
Estando presente no evento de leilão realizado na B3, Alckmin ressaltou que, apesar do desconto baixo, isso é reflexo do mercado. Diversas autoridades presentes também se surpreenderam com o pequeno deságio.
“Esse caso deve servir de exemplo para evitar que isso se repita em futuros leilões de projetos complexos. O ideal é que o Estado tome medidas para atrair mais participantes e aumentar a competição, como ampliar a divulgação internacional”, afirma Gustavo Justino de Oliveira, professor de direito administrativo da USP e IDP.
“É possível melhorar a distribuição de riscos, garantias e mecanismos financeiros para facilitar a viabilidade dos projetos”, complementa.
A Mota-Engil deve assinar o contrato até o fim do ano, após a análise das garantias, e a expectativa é iniciar a obra em 2026. O término está previsto para 2030, embora o prazo oficial seja até 2031.
“Os descontos baixos e o número reduzido de participantes indicam que, apesar dos esforços do governo para reduzir riscos, as condições e o retorno esperado estão apertados para um projeto tão complexo”, explica o advogado especialista em infraestrutura Fernando Vernalha.
Uma semana antes do leilão, em 29 de agosto, o ministro do TCU, Bruno Dantas, se reuniu com representantes dos ministérios e autoridades responsáveis para ajustar a fiscalização e acompanhamento da obra.
Na mesma época, construtoras brasileiras como Odebrecht e Andrade Gutierrez tentavam organizar o financiamento para participar, mas desistiram devido à falta de financiamento adequado e exigências elevadas de garantias, afetando a concorrência.
“Projetos de infraestrutura exigem altos investimentos e apoio governamental para fortalecer as empresas envolvidas, pois são essenciais para o desenvolvimento econômico e social e geram efeitos multiplicadores”, afirma o especialista em projetos de infraestrutura Massami Uyeda Junior.
O governo paulista não comentou as avaliações dos especialistas.
Há consenso de que as ofertas foram conservadoras, o que pode não ser negativo. Pode indicar que o orçamento será cumprido sem necessidade de revisões futuras.
“O baixo desconto mostra que tanto quem estruturou o projeto quanto os participantes acreditam na viabilidade financeira da obra. Para o governo, o desconto menor significa que os recursos previstos serão mesmo utilizados”, destaca Henrique Silveira, sócio da área de Infraestrutura e Energia do escritório Mattos Filho.
“Projetos que tiveram muita concorrência e grandes descontos frequentemente enfrentam depois reequilíbrios financeiros ou dificuldades para a concessionária cumprir o contrato devido à menor receita”, lembra o advogado Diogo Nebias, especialista em contratos de infraestrutura.
