A Comissão do Esporte possui uma subcomissão que trata especificamente sobre o tema das apostas. Representantes do governo e do setor de apostas esportivas destacaram nesta quarta-feira (27) que a proibição de apostas em situações específicas durante as partidas — como cartões, escanteios e faltas — pode incentivar mais apostadores a buscar o mercado ilegal. Essa restrição está prevista no Projeto de Lei 2842/23 e foi discutida pela Subcomissão Permanente de Regulação de Apostas Esportivas, vinculada à Comissão do Esporte da Câmara dos Deputados.
Letícia Soeiro, do Ministério da Fazenda, ressaltou que o projeto, de iniciativa do deputado Ricardo Ayres (Republicanos-TO), pode reduzir o risco de fraudes relacionadas à manipulação dos resultados, mas também diminuir o interesse pelo mercado legal, regulamentado pela Lei 14.790/23.
“É uma questão que demanda análise cuidadosa. Como reguladores, nosso papel é minimizar riscos exigindo políticas de prevenção contra manipulações e comprovação de vínculo com entidade independente que monitore a integridade esportiva”, afirmou Letícia, que coordena o Jogo Responsável na Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA).
Gabriel Lima, diretor-executivo da Liga Forte União do Futebol Brasileiro, mencionou estudos realizados na Bélgica e no Reino Unido, os quais indicam que restrições rigorosas levam apostadores ao mercado ilegal. Ele também mostrou preocupação quanto aos contratos de patrocínio, enfatizando que quase todos os clubes das séries A e B dependem financeiramente das casas de apostas.
Rafael Marcondes, presidente da Associação de Bets e Fantasy Sport (aBFS), explicou que 90% dos casos de manipulação de resultados estão associados ao mercado principal de apostas (resultado final dos jogos), enquanto que o mercado secundário (escanteios e cartões) representa apenas 13%. Ele reforçou que a manipulação é um problema global e não pode ser enfrentada apenas com medidas locais. “Mesmo se o Brasil proibir essas apostas, elas continuarão ocorrendo em sites internacionais.”
Tiago Barbosa, da Genius Sports, afirmou que de 70% a 80% das apostas no Brasil acontecem em plataformas ilegais. Restrições no mercado legal impactariam apenas entre 20% e 30% do total.
Giovanni Rocco Neto, secretário nacional do Ministério do Esporte, ressaltou que o foco deve ser o combate às casas ilegais. “A questão das apostas não se resolve com medidas simples. A única saída é usar tecnologia para bloquear e rastrear o dinheiro das casas ilegais, além da atuação policial, pois criminosos precisam ser enfrentados com polícia.”
Dependência e publicidade
A audiência também abordou temas ligados à publicidade, patrocínio e aos efeitos do vício em jogos. O deputado Caio Vianna (PSD-RJ), que convocou o debate, questionou o Ministério da Saúde sobre o número reduzido de atendimentos a pessoas com dependência em apostas digitais.
O diretor do Departamento de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas, Marcelo Dias, explicou que muitos dependentes não procuram ajuda e que frequentemente o encaminhamento só ocorre com insistência da família ou dos profissionais. O ministério pretende integrar o problema às políticas de saúde mental, atuando especialmente na atenção básica, sem tratar a dependência como fraqueza individual.
Caio Vianna também defendeu que as empresas adotem práticas publicitárias mais conscientes. “As casas de apostas precisam assumir a responsabilidade de conscientizar a população brasileira, utilizando a própria publicidade para mostrar que o objetivo não é apenas o lucro.”