Dentistas e funcionários do Conselho Regional de Odontologia do Distrito Federal (CRO-DF) acusam o órgão de omissão por não abrir processo ético contra o cirurgião-dentista Gustavo Chiovatto Najjar, condenado a seis anos de prisão pelo estupro de uma paciente. Mesmo com a repercussão do caso, o profissional continua registrado e atuando normalmente.
Conforme a Resolução CFO-59/2004, o processo ético pode ser iniciado pelo presidente do Conselho Regional de Odontologia por iniciativa própria, denúncia ou representação formal. Antes disso, a Comissão de Ética deve avaliar se há indícios de infração ao Código de Ética Odontológica.
Fontes internas do CRO-DF relataram que, apesar de haver sete denúncias de importunação sexual contra Gustavo Najjar e sua condenação por abuso sexual, não foi aberta nenhuma investigação ética. Tampouco foram aplicadas medidas como suspensão do registro profissional ou restrições ao exercício da odontologia.
Servidores, que pediram anonimato, afirmam que a proteção ao dentista está associada à influência de seu pai, Samir Najjar, ex-presidente do conselho.
“A interferência política do pai prejudicou a imparcialidade do órgão. Samir Najjar já presidiu o CRO-DF por três mandatos e atua no Conselho Federal de Odontologia. Houve, inclusive, ordem expressa para não abrir processos contra o filho”, informam as fontes.
Em outubro do ano passado, a 3ª Vara Criminal de Brasília condenou Gustavo Najjar a cumprir pena em regime semiaberto. A defesa recorreu, mas o recurso ainda não foi analisado e o processo corre sob sigilo.
Vítimas não denunciaram diretamente ao conselho, e o Ministério Público não notificou a autarquia, que também não tomou iniciativa própria, apesar de poder fazê-lo.
O CRO-DF declarou que não recebeu notificação formal para agir num caso ético. Ressaltou que, sem provocação formal, provas sob sigilo e participação direta da vítima, não há base legal para abrir processo, sob risco de violar direitos fundamentais.
A autarquia ainda destacou que qualquer apuração interna depende da conclusão do processo criminal sigiloso e que o juiz da sentença não impôs restrições ao exercício profissional do condenado, inviabilizando medidas paralelas no conselho.
O conselho negou que as decisões estejam sujeitas a influências políticas e solicitou provas para apurar denúncias nesse sentido. A atual gestão afirma atuar estritamente conforme a lei, ética e devido processo legal.
Código de Ética Odontológica
Para os profissionais da área, a inação do conselho viola suas obrigações legais, que incluem fiscalizar o exercício da odontologia, deliberar sobre ética e aplicar penalidades em caso de infração.
O Código de Ética Odontológica pune quem se aproveita da relação profissional-paciente para obter vantagens indevidas ou desrespeita os pacientes. Infrações podem gerar advertência, censura, suspensão por até 30 dias ou cassação do direito profissional, além de multas.
A gravidade da penalidade considera danos e consequências, especialmente se houver exploração da vulnerabilidade do paciente. Multas podem ser multiplicadas em caso de reincidência.
Estupro de influenciadora digital
Gustavo Najjar ganhou notoriedade em 2023, quando uma influenciadora digital revelou ter sido abusada sexualmente por ele, após ser convencida a realizar uma avaliação para procedimento estético.
Durante a consulta no consultório, ele pediu para tocar o corpo dela e, sob pretexto de um teste, deu um tapa nas nádegas. Quando ela tentou sair, ele a agarrou e consumou o estupro, mesmo após a vítima tentar resistir e pedir para ir embora.
Após o crime, o dentista agiu como se nada tivesse acontecido, falando sobre procedimentos estéticos. A vítima registrou a ocorrência com o auxílio do ex-marido e apresentou laudos que confirmaram o abuso por meio de DNA e lesões compatíveis.
Gustavo foi preso por 16 dias e depois liberado. A defesa nega as acusações. A decisão judicial baseou-se em depoimentos, documentos e imagens que evidenciaram o desespero da vítima durante o ataque.
Após a denúncia inicial, outras sete mulheres procuraram a polícia, quatro delas de forma anônima.