Por 337 votos a favor e 32 contra, a Assembleia Nacional (Câmara baixa) aprovou a proposta de lei promovida pela esquerda
Os deputados franceses aprovaram, nesta quinta-feira (24), incluir o aborto na Constituição, o primeiro passo de uma iniciativa para fornecer este direito no país, em resposta aos retrocessos registrados nos Estados Unidos.
“Quero dedicar essa vitória histórica […] às mulheres dos Estados Unidos, às mulheres da Polônia, às mulheres da Hungria cujo direito ao aborto está sendo restringido”, afirmou a relatora do texto, a deputada esquerdista Mathilde Panot
Por 337 votos a favor e 32 contra, a Assembleia Nacional (Câmara baixa) aprovou a proposta de lei promovida pela esquerda, que agora precisa da aprovação do Senado e dos franceses, em referendo, para entrar em vigor.
“Hoje a França fala ao mundo”, celebrou Panot.
Ela pediu ao governo, porém, que apresente um projeto de lei próprio para agilizar o processo, o que permitiria evitar um referendo.
A Assembleia Nacional (Câmara baixa) aprovou modificar a Carta Magna de 1958 para incluir que “a lei garanta a efetividade e a igualdade de acesso ao direito à interrupção voluntária da gravidez”.
O aborto foi descriminalizado na França em 1975 por uma lei promovida por Simone Veil, ícone da emancipação feminina e sobrevivente do Holocausto. A última modificação foi em março para estender o prazo para 14 semanas.
– ‘Nenhuma democracia está a salvo’ –
A anulação do direito ao aborto em nível nacional nos Estados Unidos pela Suprema Corte em junho chocou o mundo e, na França, resultou no anúncio de iniciativas do governo e da oposição para blindá-lo.
“Nenhuma democracia, mesmo a maior de todas, está a salvo” de um retrocesso, alertou o ministro da Justiça, Éric Dupond-Moretti, que manifestou o apoio do governo à iniciativa.
Embora o partido A França Insubmissa (LFI, esquerda radical), redator do projeto de lei, também tenha procurado incluir o direito à contracepção na Constituição, desistiu desse ponto para chegar a um consenso.
O ministro havia alertado que, com a redação inicial, a proposta tinha poucas chances de prosperar no Senado – que rejeitou texto semelhante em outubro – e pediu para se concentrar no aborto, retirando assim os contraceptivos.
Apesar de durante o debate os partidos da direita Os Republicanos e da extrema direita Reagrupamento Nacional (RN) terem questionado a necessidade da proposta, seus deputados se dividiram na hora de votar.
Totalmente proibido numa minoria de países, autorizado em outros com mais ou menos restrições, o acesso ao aborto continua sendo um direito muito desigual no mundo e sofreu uma série de retrocessos nos últimos meses.
Em junho, a Suprema Corte dos Estados Unidos – com maioria conservadora – revogou esse direito, depois de derrubar a decisão que permitia o aborto desde 1973, abrindo assim a porta para que cada estado decida se o autoriza ou não.
Na Europa, a Hungria do primeiro-ministro ultraconservador Viktor Orban obriga as mulheres que querem abortar a ouvir os batimentos cardíacos do feto, antes da intervenção, desde meados de setembro.