Um documento do Ministério Público Federal (MPF) revela que o ex-ministro da Previdência, José Carlos Oliveira, que atualmente atende pelo nome de Ahmed Mohamad, tinha conhecimento sobre descontos indevidos feitos na folha de pagamento de aposentados e pensionistas em 2018. Naquele ano, ele exercia o cargo de superintendente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em São Paulo. Atualmente, ele presta depoimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga fraudes no INSS.
Descoberta do escândalo
O escândalo envolvendo o INSS começou a ser noticiado pelo portal Metrópoles a partir de dezembro de 2023. As investigações apontaram que as entidades responsáveis pelos descontos em mensalidades de aposentados tiveram uma arrecadação que ultrapassou R$ 2 bilhões em um único ano, em meio a milhares de processos por fraudes envolvendo filiações irregulares de segurados.
Essas reportagens motivaram a Polícia Federal (PF) a iniciar um inquérito e também subsidiaram as investigações da Controladoria-Geral da União (CGU). Ao todo, 38 matérias do Metrópoles foram usadas pela PF para fundamentar a Operação Sem Desconto, deflagrada em 23 de abril, que resultou na demissão do presidente do INSS e do ministro da Previdência, Carlos Lupi.
Denúncias oficiais contra Oliveira
Em 5 de junho de 2018, Oliveira foi notificado por um procedimento preparatório conduzido pela procuradora da República Priscila Costa Röder, que alertava para descontos irregulares feitos em benefícios de aposentados. Segundo o documento, houve lançamentos indevidos de valores referentes a contribuições como a denominada “contribuição CENTRAPE” e débitos realizados a favor de uma entidade chamada ANAPPS, sediada em Porto Alegre.
O documento destaca também a dificuldade enfrentada pelos beneficiários para o cancelamento desses descontos, relatando que mesmo após solicitar o cancelamento em agências do INSS, os débitos poderiam continuar sendo lançados por essas empresas ou por outras que eventualmente surgissem.
Alerta para a repetição do problema
A procuradora alertou sobre a possibilidade dos descontos indevidos estarem ocorrendo em âmbito nacional, prejudicando uma parcela significativa dos aposentados. Ela exigiu que o superintendente adotasse ações eficazes para evitar que novos cidadãos fossem lesados por tais práticas.
“O problema pode estar afetando a coletividade em geral, fazendo-se necessário que a autarquia tome medidas eficazes para impedir que cidadãos vulneráveis enfrentem essas situações”, destacou no documento.
Oliveira teve um prazo de 10 dias para responder e informar quais providências estavam sendo adotadas para coibir a fraude. Em sua resposta, datada de 26 de junho de 2018, ele informou que os beneficiários poderiam solicitar a suspensão dos descontos junto às entidades ou diretamente em agências do INSS, mencionando também que os acordos para esses descontos haviam sido firmados pela Diretoria de Benefícios em Brasília.
Trajetória de Oliveira e ligação com o escândalo
Quatro anos após esses eventos, em 2021, Oliveira foi convidado para assumir a diretoria de benefícios e, posteriormente, foi nomeado ministro da Previdência durante o governo de Jair Bolsonaro, do Partido Liberal (PL).
Durante seu depoimento na CPMI, apresentado pelo senador Fabiano Contarato (PT) e pelo deputado federal Alencar Santana (PT), Oliveira inicialmente negou conhecimento dos descontos realizados por entidades vinculadas ao INSS. No entanto, suas contradições na audiência resultaram em ameaças de prisão em flagrante em pelo menos duas ocasiões.
Ahmed Mohamad Oliveira justificou a falta de investigação sobre os descontos associativos alegando que, até 2021, não havia denúncias específicas sobre essa modalidade, apesar de existirem inúmeros apontamentos da CGU e acórdãos do Tribunal de Contas da União (TCU).
Envolvimento com entidades suspeitas
Oliveira é acusado de autorizar descontos realizados por entidades associadas a um indivíduo conhecido como “careca do INSS”. Uma dessas entidades, a Associação de Aposentados Mutualista para Benefícios Coletivos (AMBEC), é apontada pela PF como uma das principais beneficiadas pelos descontos. Até março de 2025, a AMBEC teria arrecadado cerca de R$ 500,9 milhões por meio dessas contribuições.
O crescimento da arrecadação da AMBEC foi exponencial a partir de 2022, chegando a quase R$ 91,3 milhões em 2023. A entidade também possui transações financeiras suspeitas com o “careca do INSS”, tendo realizado pagamentos da ordem de R$ 11,9 milhões para empresas ligadas a ele.
Além disso, José Laudenor, sócio de Oliveira em uma empresa, figura em transações suspeitas relacionadas a Cícero Marcelino, apontado como operador da Conafer e alvo de recente operação da PF sobre o INSS.
De acordo com a PF, Oliveira, que mudou seu nome para Ahmed Mohamad, é considerado uma Pessoa Exposta Politicamente (PEP), tendo ocupado cargos importantes como presidente do INSS e ministro do Trabalho e Previdência.