Situação agrava as contas dos governos regionais, já debilitadas pela pandemia
Enquanto esperam há mais de 70 dias socorro financeiro do governo federal, os estados têm um desafio para manter as contas em dia nos próximos anos, já que os efeitos econômicos do novo coronavírus não vão se restringir a 2020.
A redução na demanda por combustíveis causada pela pandemia, além da queda nos preços do petróleo no mercado internacional, devem levar a uma perda de arrecadação de até R$ 36 bilhões para os estados até 2022. A estimativa foi feita em um estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao governo federal.
O valor se refere apenas à perda de arrecadação com ICMS. A estimativa não inclui royalties e participações especiais. Nesse caso, também haverá forte perda de arrecadação, principalmente para estados produtores, como é o caso do Rio.
A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), por exemplo, estima que a arrecadação diária de royalties do petróleo apresente queda de mais de 50% em 2020, na comparação com a média de 2019.
Perdas de R$ 18 bi para a União
O imposto sobre combustíveis representa cerca de 20% de toda a arrecadação com ICMS dos estados. Junto com as comunicações e a energia elétrica, o imposto sobre combustíveis é uma das principais formas de arrecadação de estados via ICMS.
Para a União, a perda projetada pode chegar a R$ 18 bilhões, com o PIS/Cofins e a Cide, segundo a EPE, a depender da evolução da crise.
“No que tange à arrecadação de tributos com a comercialização de combustíveis, estima-se que as perdas poderão potencialmente alcançar R$ 54 bilhões de forma agregada ao longo de todo o período analisado (2020 a 2022). Desse montante, os tributos de responsabilidade federal respondem por até R$ 18 bilhões, enquanto os de responsabilidade estadual podem atingir R$ 36 bilhões”, destaca o estudo da EPE.
Para comparação, em todo o ano de 2019, os estados, juntos, arrecadaram R$ 89 bilhões com ICMS sobre combustíveis. Neste ano, a arrecadação soma, até maio, R$ 31 bilhões, queda de 14% na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo dados do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
A maior perda projetada dentre os combustíveis é a da gasolina. A demanda por esse combustível deve cair de 8% a 17% em 2020. Também haverá queda com etanol e diesel. A arrecadação com o gás de cozinha (GLP), por outro lado, tende a subir, porque o consumo desse bem aumentou.
Municípios também têm perdas
Juliana Damasceno, pesquisadora do Ibre/FGV, lembra que o ICMS é o principal tributos dos estados, mas também importante para os municípios, que ficam com parte dessa arrecadação.
“Enquanto as atividades não voltarem, num ritmo normal dos setores, a gente não vai ver a recuperação das receitas. O ICMS é o imposto de serviços e segue muito a dinâmica da economia. Se a atividade está mais forte, gera um aumento da arrecadação. O preço do petróleo também tem um impacto muito grande”, disse.
Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), avalia a restrição fiscal nos estados já era muito apertada e vai ficar ainda pior. Para ele, a recuperação muito lenta da economia, a partir de 2021, vai manter a dinâmica de receitas em uma trajetória preocupante.
“As medidas que já eram recomendáveis antes passam a ser quase mandatórias: ajuste de pessoal e reformas previdenciárias para valer, inclusive com fixação de idade mínima. A União terá papel central nisso, porque no modelo federativo brasileiro, o governo central funciona, ou deveria funcionar, como árbitro nas questões que envolvem os entes subnacionais”, afirmou.
Neste ano, dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP) indicam queda nas vendas de querosene de aviação (-85%), gasolina (-29%), e óleo diesel (-14%) realizadas no mês de abril, em comparação com o mesmo período de 2019. As vendas de GLP aumentaram 4% no mesmo mês. Segundo o Ministério da Agricultura, a comercialização de etanol hidratado diminuiu 37% em abril, considerado o fundo do poço do impacto econômico da pandemia. A tendência de queda deve seguir nos próximos meses e anos.
O estudo da EPE lembra que a queda na circulação de pessoas tem proporcionado mudanças de hábitos e de costumes na sociedade, incluindo uma rápida ampliação e disseminação do trabalho remoto.
Além disso, uma ampla parcela de produtos e serviços estão sendo disponibilizados em plataformas online, diminuindo o deslocamento do consumidor e alterando a logística necessária para acessá-los. A EPE diz que essas ações “possuem potencial de destruição de uma parcela significativa da demanda pré-existente de petróleo”.